Atenção: o texto a seguir contém spoilers do décimo quinto e do décimo sexto episódios de “Digimon Adventure:”.
Anteriormente, em Digimon Adventure: (gravado assim mesmo, com os dois pontos): Ainda divididas em duas frentes para cobrir o maior espaço possível na trajetória aos digimons sagrados, as turminhas de digiescolhidos enfrentaram diferentes ameaças envolvendo criaturas invertebradas com exoesqueleto quitinoso, com Garudamon e AtlurKabuterimon vindo à tona por consequência.
No décimo quinto episódio, uma perseguição no reino gelado…
Com todos os demais digiescolhidos já brilhando os brasões de seus digivices, resta apenas a Joe viver sua jornada de desenvolvimento pessoal a fim de evocar sua característica mais forte e, nisso, elevar Gomamon à forma perfeita. E essa característica, no caso, é a confiança. Confiança essa que vinha sendo mostrada como bastante ausente no personagem, convenhamos.
Particularmente, gosto bastante do background do Joe num geral. Um moleque um tiquinho mais velho que o resto do grupo, embebido em algumas convenções sociais japonesas que parecem lhe exercer bastante pressão. Por ser um “senpai”, supostamente “responsável” pelos mais novos ao redor, ele precisa “se portar” como tal, ainda que não tenha o tipo de personalidade que se sobrepõe às outras, mais fortes, mais “liderantes”. Taichi (Tai), com seus trejeitos mais escandalosos, e Yamato (Matt), com sua pose gringa misteriosa e carrancuda, ocupam melhor esse posto. Mas ele tenta liderar, sem talento algum pra isso, e aí falha, já que não é levado a sério pelos colegas, e se frustra. Faz sentido pelo que ele é, pela forma como foi construído. E pela confiança que precisa desbravar para se desenvolver.
E o meio utilizado para que ele desbravasse isso não foi exatamente original (já chego nisso), mas competente pro que foi proposto. Ainda a caminho do local onde os digimons sagrados supostamente estão presos, ele chega com Sora e Yamato no pé de uma montanha de neve. Eles vinham sendo levados por Birdramon através do ar, mas ela precisava descansar por um tempo antes que, novamente, voasse com as crianças até o fim do percurso. Então, o plano seria esse: Garurumon atravessaria a montanha com todos nas costas e, mais para frente, num rio bem grande já avistado, seria a vez de Ikkakumon levá-los.
Nem deu tempo de começar e já deu errado. Eles foram abordados por um bando de Yukidarumons liderados pelo gigantesco Mammon, todos bem poderosos e eficazes nesse território gelado. No meio da briga, Sora é ferida e, como se atingida por um veneno digital, começa a congelar lentamente, precisando ser aquecida por uma fogueira o quanto antes. Resta aos outros dois traçar alguma estratégia para afastar os adversários o máximo possível da garota. E quem fica com a tarefa de servir de isca? Ele mesmo, Joe! Junto com Ikkakumon, ele guia os inimigos congelantes pro lado inverso ao que Yamato e Garurumon carregam Sora e Piomon (exausta pelas horas anteriores de voo). No fim, eles chegariam ao mesmo lugar (o outro lado do rio), mas se o roteiro não fez questão de explicar essa incoerência, eu que não colocarei meu esforço nisso.
O problemão para Joe é que Ikkakumon e ele ficaram sozinhos contra uma penca de digimons tão poderosos quanto, em seu mesmo nível, e outro ainda superior, na cola. Nessa, um bom pedaço do episódio serve como um “pegue o pombo” na neve, com eles correndo e escapando de ataques até, ao fim, estarem encurralados e Joe precisar agir, adquirindo confiança em seus atos na marra. Então, seu brasão brilha no digivice e Ikkakumon superdigivolve para…
Zudomon!
Inicialmente, havia achado a ideia dos digimons chegarem na forma perfeita rápido assim desnecessariamente apressada, mas confesso que é bom fitar uma temporada onde poderão utilizar um digimon da escala do Zudomon, com suas habilidades e seu martelão elétrico, em eventuais batalhas melhor animadas que o animê original de 1999. Infelizmente, não acho que tenha sido o caso desse episódio em especial, não tão detalhado e caprichado quanto boa parte da série até então. Talvez o cenário, transitante entre gelo nas montanhas e gelo no rio, não tenha ajudado tanto. Mas é sempre bom que possibilidades sejam dispostas. Ao fim, Mammon pereceu, Sora se aqueceu e tudo acabou bem.
Havia dito que esse foi um episódio competente no que deveria fazer. Joe desenvolveu sua autoconfiança, os amigos enxergaram nele uma figura confiante, Zudomon apareceu. Era a ideia. Contudo, tenho minhas ressalvas quanto ao “formato” usado pra isso. Essa estratégia de roteiro incluindo uma grande ação perigosa que cobrirá boa parte das minutagens do episódio tem sido repetida com certa frequência em Digimon Adventure:, não chegando a errar de verdade em momento algum (sempre são situações engajantes, que prendem a atenção), mas já começa a cansar a essa altura do campeonato. Sinto que o ápice foi no começo de agosto, com os digiescolhidos invadindo a fortaleza da maneira mais perigosa, irresponsável e visualmente impressionante possível. Quando isso é refeito, e refeito, e refeito, soa preguiçoso da parte dos envolvidos. Gostaria de mais episódios como o décimo segundo, da Lilimon contra o Andromon, envolvendo tramas um tiquinho mais criativas que demandassem mais esforço do lado de lá para prender minha atenção.
Caso do seguinte, que, novamente, fez isso com maestria…
E no episódio 16…
Esquisitice. Loucura. Terror psicológico. Horror visual. Plot twists. Intriga. Tristeza. Um inimigo criativo. Novidades. Medo. Perigo. Locações bizarras. Uso criativo das possibilidades disponíveis em uma animação. Tudo está lá!
O décimo sexto episódio foi um dos maiores acertos que a temporada nos mostrou até esse momento, sendo um daqueles exemplares que não só funcionam isoladamente, como algo para o público atual, que está tendo seu primeiro contato com Digimon aqui, quanto para os fãs velhos de guerra. O modo como a trama foi construída me remete ao icônico oitavo episódio da série de 1999, “Devimon, Mensageiro das Trevas”, na ideia de apresentar um local de respiro e segurança para os digiescolhidos, que acreditam estarem a salvo por um certo tempo, mas rapidamente subverter esse cenário num momento de perigo asqueroso ainda não vivenciado antes.
No de duas décadas atrás, as crianças, após enfrentarem uma porção de situações de risco e evoluírem seus digimons para a forma “Campeão”, encontram uma mansão de arquitetura antiga, com um banquete pronto servido à mesa, banhos quentes disponíveis e camas confortáveis para que passem a noite. E eles vivem aquilo como uma recompensa a tudo o que passaram na Ilha Arquivo, sendo o primeiro período de “normalidade” e esperança deles em um bom tempo. Porém, isso desce pelo ralo que, no meio da noite, eles são atacados por Orgemon e Leomon, sendo tudo isso um plano maléfico do mortal Devimon, que brincou com as mentes dos digiescolhidos montando uma grande ilusão. É um episódio espetacular, pois brinca com a antonímia de “bem” e “mal”, inserindo uma porção de segmentos que ilustram isso com virtuosidade (meu predileto é quando o Devimon sai de uma pintura de anjo). Esse embate entre luz e trevas, esperança e desespero, alívio e depressão, retorna aqui, mas usando outros elementos em tela.
Taichi, Koshiro (Izzy) e Mimi enfim conseguem chegar ao local esperado, acreditando que encontrarão por lá os misteriosos digimons sagrados que os ajudarão não só a sair daquele mundo, mas a salvar o Tóquio do apagão. O caminho percorrido é esquisito, uma caverna com uma escadaria, só que as paredes possuem um aspecto “vivo”. Quando chegam na saída desse túnel, se deparam com algo que não estavam esperando:
Tóquio! As crianças são transportadas de volta para o seu mundo de origem, finalmente escapando da horrível dimensão digital a qual estavam presas. Indo de boquiabertos e confusos a emocionados, o trio imediatamente começa a fazer planos. Mimi, por exemplo, estava ansiosa por um hambúrguer de abacate da moda. Os outros preferiam coisas mais sensatas e chatas, como ir para casa e tomar banho. Para isso, pegaram o metrô.
Só que alguma coisa parecia errada. Embora todos na rua andassem olhando seus celulares, a internet não funcionava nos aparelhos dos digiescolhidos. Além disso, nenhum transeunte pareceu se importar com a presença de um dinossauro laranja, um inseto do tamanho de um cachorro e uma planta antropomórfica falantes. As pessoas ao redor, inclusive, tinham um vocabulário robótico e limitado, dando “erro” quando forçados a irem mais que o automático. E como se estivessem num filme do Luis Buñuel com o Salvador Dali, eles simplesmente não conseguiam chegar onde queriam, como se o metrô de Tóquio fosse formado por trilhos e corredores subterrâneos infinitos que retornavam sempre ao mesmo ponto.
A verdade é que aquela não era Tóquio e os três estavam, possivelmente, dentro de um digimon que havia “copiado” a metrópole em dados e enganado as crianças. O sonho se converteu em um pesadelo. E dos piores, dos que estamos cientes de fazer parte, mas não conseguimos acordar. O Eyesmon se mostra um oponente quase impossível de se derrotar, mesmo com MetalGreymon, AtlurKabuterimon e Lilimon investindo em seu máximo. Até que, num ápice narrativo, Yamato, Sora e Joe chegam ao local combinado, colocando WereGarurumon, Garudamon e Zudomon no jogo.
Os seis juntos conseguem deter Eyesmon, ao menos momentaneamente, mas agora a linha do tempo do digimundo se cruza com a do Japão, e os acontecimentos passam a correr ao mesmo tempo. Piorando o que já era terrível, um outro inimigo surge imponente no horizonte…
E é isso. Os digiescolhidos se reuniram novamente, com todos os digimons já em suas formas perfeitas, no lugar onde lutaram tanto para alcançar. O que acontecerá daqui para frente? Torço para que isso envolva anjos e demônios metaleiros que usam calças. Mal posso esperar.
Comentários dos episódios 1, 2, 3, 4 e 5, 6 e 7, 8 e 9, 10, 11 e 12, e 13 e 14.
Com transmissão simultânea ao Japão por aqui através da Crunchyroll, Digimon Adventure: é um reboot do animê original de mesmo nome (mas sem os dois pontos), produzido pela Toei Animation, em 1999. Assista aqui.
Sinopse pela Crunchyroll:
É o ano de 2020. A Rede tornou-se algo indispensável para a vida dos humanos. Mas o que eles não sabem é que, por trás da Rede, existe um mundo de luz e trevas conhecido como o Mundo Digital, habitado pelos Digimons. Quando Taichi Yagami tenta salvar sua mãe e sua irmã, que estão a bordo de um trem desgovernado, ele entra na plataforma… e um estranho fenômeno o leva para o Mundo Digital. Ele e outros Digiescolhidos encontram seus parceiros Digimons e embarcam numa aventura em um mundo desconhecido!
O roteiro é assinado por Atsuhiro Tomioka, que já trabalhou em várias séries infantis como Bucky, Hamtaro, Super Onze e Pokémon. No Japão, o animê substitui o horário de GeGeGe no Kitarou na FujiTV, série que se encerrou ao fim da última temporada de inverno japonesa e também foi exibida por aqui pela Crunchyroll.
Só uma curiosidade: apesar do brasão do Joe ter sido traduzido como Confiança, no Japão ele representa outra coisa e tem um significado mais abrangente, como: responsabilidade, fé, confiança, honestidade e altruísmo. É como se fosse um ideal ou virtude de como ser um bom homem japonês, e o engraçado é que o Gomamon também tem um papel nesse meio, tipo, como se ele representasse a esposa que sempre deve apoiar e incentivar o marido (o que é constatado várias vezes pelas ações que ele tem com o seu digiescolhido). :v
Pq demoram tanto com as reviews??
Bom, pelo menos a animação segue fielmente a original.
Estou interessada no Patamon.
Tem dublado já?