2020 não foi fácil pra ninguém. Muita coisa atrasou, cancelou, caiu no improviso e com o tokusatsu não foi diferente nesse louco ano pandêmico. Vimos Kamen Rider Zero-One e Kiramager entrando num hiato forçado, mas retornando semanas depois. Não que devamos agradecer a esse problema, mas a ocasião, que impôs uma quarentena em março, acabou nos trazendo entretenimento e alegria com a volta de alguns clássicos do tokusatsu, principalmente nas nossas telinhas.
Vamos embarcar direto no túnel do tempo…
Retorno inesperado
Se alguém dissesse que Jaspion, Changeman e Jiraiya tinham chances de passar no Brasil antes de 20 de março de 2020, quando houve o anúncio para a exibição dessas séries na Band em dois dias, ninguém acreditaria – nem mesmo este que vos escreve. Aliás, até houve um rumor no mês anterior, mas tudo era incerto. Por incrível que pareça, a pandemia acabou forçando a volta dos heróis da Manchete.
Ainda bem que Jaspion e cia reestrearam numa manhã de domingo, ao invés de ser nas madrugadas, como o rumor já mencionado previa. Era um bom momento para o Brasil, ao mesmo tempo em que Kamen Rider estreava nos EUA e também era inaugurado o canal da Toei no YouTube. O clima era festivo, mas de incertezas por aqui.
Ajustes precisavam ser feitos e a Band demorou a atender o público. Primeiro de tudo, as imagens dos episódios estavam bem esticadas, com um falso widescreen. Por mais que a Band alegasse “adaptação para os tempos modernos”, a desculpa não colava. Ora, o SBT exibia Chaves (saudades!) no formato de tela da época e não era nenhum problema. Aliás, não era problema a Band exibir reprises de jogos de futebol dos anos 1980 e 1990 com o formato original, né? Faltou visão da emissora para com as séries japonesas. Tudo bem que Jaspion atraiu parte da criançada, mas o público-alvo mesmo era gente com mais de 30 anos (como é o meu caso).
Jaspion dobrou a audiência da Band, marcando 2.6 pontos, o que é muito para os padrões da casa. E não foi só isso. Os nomes dos heróis estiveram nos cinco primeiros trending topics do Twitter. Era uma espécie de “salvação” do tokusatsu no Brasil e também da Band, que iria apresentar o Sub-20, se a pandemia não tivesse acontecido. O sucesso não só fez com que a Band adotasse o formato de tela original no sétimo domingo, mas também provou que até séries “velhas” e “ultrapassadas” poderiam resgatar a força do tokusatsu por aqui. Isso tudo, apesar de uma aparente “torcida do contra”, mais focada em ressaltar o status de tapa-buraco da série.
Veja bem: não é errado dizer que Jaspion, Changeman e Jiraiya retornaram como tapa-buraco. Eram sim, de fato, e é preciso que se diga que outros canais de TV tiveram que fazer o mesmo com alguns de seus respectivos horários (a novela das nove, por exemplo, volta do hiato no ano que vem). Havia a expectativa do fandom para a permanência do tokusatsu na Band. A possibilidade da volta de Flashman e Jiban para as telinhas era cogitada. Mas nem tudo eram flores.
Pra complicar as nossas vidas (ou melhor, nossos domingos), a Band resolveu reduzir o horário de Changeman e Jiraiya, que voltaram a ter um episódio cada no dia 14 de junho. Motivo? Um show da Cláudia Leitte depois da hora do almoço. Jaspion estava prometido para ter apenas um episódio e foram entregues dois, para cobrir 20 minutos restantes. Faltou profissionalismo da Band para informar a distribuidora e a imprensa, com detalhes, sobre a tal mudança. A duração daquele dia não bateu com o que estava na programação. E a Claudinha, hein? Quase atingiu 2 pontos e finalizou com 0.6. Felizmente, a Band voltou atrás e as três séries voltaram a ter seus dois episódios normalmente, no lugar de onde não deveriam ter saído.
Em julho, os reclames do “plim-plim” voltaram a transmitir a Fórmula 1 e a audiência dos heróis caiu temporariamente (normal, se tratando de um evento esportivo). Mesmo assim, a Band ainda demonstrou interesse em passar tokusatsu em outro horário, para quando o futebol voltar aos domingos. Mas a falta de anunciantes ainda era um ponto negativo. O consolo foi que o bloco alcançou 2.5 pontos no penúltimo domingo com Jaspion na programação.
Na hora errada!
Naquele mesmo 16 de agosto, a Sato Company anunciou a estreia de Kamen Rider Black na Band. Eu já disse aqui na coluna que fiquei feliz, ao mesmo tempo em que achei estranho um lançamento quase repentino de um clássico recém-adquirido. Tudo bem que, por um lado, era oportuno substituir Jaspion após o episódio final. Mas a gente tem que lembrar sempre que tudo que é feito a curto-prazo tem um certo preço e as coisas podem dar errado lá na frente. É um passo maior do que a própria perna.
Não deu outra. Miniatura de próxima atração com a imagem do primeiro Kamen Rider, tema em português na voz de Ricardo Cruz que foi prometido e não foi pro ar, eyecatches do primeiro episódio cortados, hashtags trocadas de última hora, título alterado para agradar saudosistas. Bobagem pouca é besteira, não é mesmo? Afinal, tivemos Black com imagem em HD, tema de encerramento sendo exibido pela primeira vez na TV brasileira, a dublagem clássica e a promessa (em uma das chamadas da Band) da exibição do episódio final, que jamais foi ao ar pela nossa saudosa Rede Manchete. Ora, o Homem Mutante tinha tudo para ter um sucesso implacável e o final (recentemente) dublado finalmente sendo lançado no início de 2021, com um engajamento acachapante e pujante dos fãs nas redes sociais. O que mais poderia dar errado?
Pois é.
E o capítulo mais constrangedor da nossa querida tokunet… aconteceu – e de maneira traumática!
Na noite de 3 de setembro, Kamen Rider Black foi suspenso da programação da Band, em virtude da lei dos direitos conexos. O problema é que o dublador Elcio Sodré não recebeu o que é dele de direito. Ele está correto e afirmar isso não é tomar partido. É lei e ponto.
Particularmente falando, eu acompanhei a repercussão e fiquei bastante chateado. Não porque tive que reescrever a coluna do dia seguinte (que estava pronta e o ponto principal seria sobre a falta de alinhamento entre a Band e a Sato Company com a exibição de Kamen Rider Black). Mas por ver o fandom se dividir de forma quase que bestial. De um lado, saudosistas mais aguerridos acusando Sodré injustamente. Do outro, gente que acusava produtores de conteúdo de “passa-pano”, sendo que sempre houve críticas e elogios às recentes exibições, inclusive por parte de veículos que possuem boa relação com a Sato Company. Ou seja, houve mais ardor do que uma busca de uma luz no fim do túnel para tentar resolver esse imbróglio, de maneira pacífica e sem acusações frívolas e/ou pouco produtivas.
O resultado é que Kamen Rider Black está no Prime Video e sem dublagem. Kamen Rider Zi-O também está na mesma plataforma e sem a versão brasileira que merecia ter (embora eu tenha um problema sério com o final dessa série, reconheço a necessidade). Como se não bastasse, surgiu outro problema: uma acusação de um perfil anônimo no Twitter que comparou legendas da Sato com materiais de fansubs. Uma das empresas assumiu o problema e finalmente alguma coisa se resolveu.
Salvando a paz e a harmonia desse combalido fandom, eis que surgiu em cena o grande Gustavo Iracema, o Gustavaum, que é um tradutor profissional conhecido entre os fãs (e que contribuiu para que esta nota fosse publicada aqui no JBox). Até o momento, foram inseridas legendas nos primeiros 37 episódios de Black e nos primeiros 25 de Zi-O. O restante deverá ser atualizado em breve.
Ah, antes que eu me esqueça. O outro problema causado pela novela da dublagem de Black foi a despedida de Changeman, Jiraiya e Jaspion da grade da Band. Foram 26 semanas ao todo. Quem me acompanha no Twitter, provavelmente deve ter visto minhas interações aos domingos, junto com outros fãs e produtores de conteúdo. Só nas duas últimas semanas que eu não participei por desmotivação.
O Esquadrão Relâmpago teve episódios com áudios de péssima qualidade (herança maldita da Focus Filmes) e foram descontinuados. Talvez essa tenha sido a última exibição de Changeman na TV, já que os direitos serão expirados num futuro não muito distante e estarão com a Hasbro. Flashman, que entraria na sequência e em outro horário, pode não ter uma nova chance na telinha. Jaspion já não tinha a mesma graça com uma reprise forçada, pois quem deveria estar lá (ou não?) era o Black. Quem deu sorte mesmo foi Jiraiya, que finalmente teve uma exibição completa depois de 21 anos, quando foi reprisado pela saudosa Manchete e pela RedeTV!. Jiban era quem deveria estar no seu lugar e, segundo informações de bastidores, a chamada para a estreia estava pronta e aguardando sinal verde. Fim melancólico de um ciclo que tinha tudo para resistir mais tempo.
O campeão voltou!
E depois de uma série de aprovações, a Editora JBC conseguiu lançar o mangá O Regresso de Jaspion. A publicação brasileira, roteirizada por Fábio Yabu e ilustrada por Michel Borges, se tornou um sucesso já nas primeiras horas da pré-venda no site da Amazon. Ou melhor, foi a mais vendida no primeiro fim de semana do período.
E valeu a pena esperar. Suspeito pra dizer: fui uma das poucas pessoas a receberem o exemplar com aquela capa a la Star Wars (valeu, Edi!). Se você ainda não comprou, tá perdendo tempo. O Regresso de Jaspion vale cada centavo e é muito mais que um fanservice: é uma homenagem aos heróis que marcaram época no Brasil, principalmente na época da Manchete.
Foi legal ver Jaspion mais uma vez depois de três décadas do fim da série de TV, praticamente com aquele mesmo jeitão cômico/brincalhão. Não vou falar muito, já que escrevi esta resenha. Mas é interessante ver personagens como Kilmaza, Boomerman, John Tiger, MacGaren e algumas outras surpresas de volta e situados num ambiente onde Satan Goss lidera algo como uma nova ordem mundial.
E aqui, desde já, aguardando uma possível continuação. Jaspion ainda tem muito pano pra manga, viu.
Também participei desta live sobre o mangá (com spoilers) no JBox TV.
Carregando…
E finalmente, estamos em dezembro, mês da estreia do canal Loading, que está no ar desde a noite desta segunda (7). Dentre o time estão os amigos Anderson “Haterman” Abraços (diretor de programação), Clayton Ferreira (apresentador do Mais Geek) e Raphael Maiffre (do bloco Mega Power Brasil). Não por isso, mas, como fã de tokusatsu e produtor de conteúdo, torço para que esse projeto dê certo.
Ajustes que precisam ser feitos. Alguma coisa ou outra ainda tá faltando, programas que estão começando cedo demais ou atrasando e etc. Não vou me deter nisso agora, jáq que é assunto para um outro artigo. Mas, falando em tokusatsu, ainda há o que ser anunciado. Talvez a expectativa inicial esteja fazendo jus ao nome do canal (a grade ainda deve estar carregando), que nasceu com ares da antiga MTV Brasil e adaptado para vários nichos de cultura pop.
E o nosso fandom não vai ficar de fora. Por enquanto, até o momento em que estou escrevendo essa edição (quinta-feira à noite), apenas Power Rangers: Morfagem Feroz está em exibição. Segundo o guia eletrônico da Claro TV, Ultraman e Garo: Makai Senki aparecem na grade dominical (pela manhã e na madrugada de domingo para segunda). Até agora não houve anúncio oficial, mas o sinal já tá dado e deve rolar no mesmo horário que a Band exibia tokusatsu, certamente com o intuito de resgatar a popularidade e o engajamento nas redes sociais, como era até 3 meses atrás.
Então, 2021 chega mais cedo, pelo menos pra gente que ganha uma nova chance com esse novo ciclo do tokusatsu na TV. Como diria o Dr. Emmett Brown, o futuro ainda não está escrito, o de ninguém está. Depois de um 2020 conturbado, o mercado de tokusatsu merece um novo estímulo no ano que chega com várias celebrações (aniversários de Ultraman, Kamen Rider e Super Sentai).
E a gente merece um pouco de paz, sossego, amizade, união e, se Deus querer, um bom caminho pra gente superar o vírus. Esse é um 2021 que a gente quer. :)
PS: A coluna volta em 8 de janeiro. Um ótimo fim de ano a todo mundo, forte abraço e bye-bye.
O texto presente é de responsabilidade de seu autor e não reflete necessariamente a opinião do site JBox.
Essa foi uma ótima retrospectiva, mas acho que faltou comentar também da disponibilização de legendas em português pelo canal oficial da Tsuburaya para a série Ultraman Z em suas exibições semanais, ainda que por um curto período, algo que aconteceu, salvo engano, pela primeira vez, e que também possibilitou o acesso de muitos fãs a uma série nova por vias oficiais.
E faltou falar que a Hasbro, aquela empresa camarada que é só pedir que libera a série original, derrubou os vídeos do canal da Sato quase que um ano antes dos direitos terminarem e ficou por isso mesmo.
Pra mim foi um ano como qualquer outro, ou seja, uma porcaria. Tokusatsu aqui no Brasil só serve pra saudosista.
“Isso tudo, apesar de uma aparente ‘torcida do contra’, mais focada em ressaltar o status de tapa-buraco da série.”
Pura verdade… Que vontade de marcar certas pessoas aqui…
Mas enfim, excelente texto!
Teve os filmes do Ultraman tmb