“Então é Natal, e o que você fez?” – normalmente, nesta época, estaríamos reclamando de entrar em qualquer loja e dar de ouvidos com essa canção, cuja letra hoje talvez soe até um tanto agressiva, em modo nonstop. Mas 2020 faz muita gente sentir saudades da música de Natal da Simone (que é uma adaptação da música do John Lennon) de tão atípico que tem sido.
Para muitos, 2020 foi um ano “perdido”. Um ano em que “tudo deu errado”. A quarentena dura meses, muita coisa paralisou. As indústrias de mangá e animê daqui, ou ao menos as que nos afetam, também passaram por todas as mudanças causadas pelo novo coronavírus.
Mas, num ano de tragédias como este, muita coisa interessante e nova surgiu. Tanta coisa aconteceu que só poderíamos falar precisamente sobre o ano após a virada, porque ainda dá tempo de ter mais surpresas. 2020 foi um ano de quarentena e pandemia, mas ainda assim, um ano denso, um ano de “revelações”, com muitos altos e baixos.
No começo, apesar da clara preocupação com a inexistente política federal de enfrentamento da “gripezinha”, todo mundo levou a quarentena de forma mais humorada, deveriam ter sido 3 semanas. Com o congelamento de filmagens e o início das reprises nas TVs, o Brasil parou para assistir ao BBB 2020, que invadiu até meios otaku tipicamente desinteressados no programa.
Mas, conforme foi ficando clara a inércia de certos agentes públicos – (falta de) atitude responsável pelo prolongamento da necessidade de uma quarentena pesada – foi ficando difícil manter a calma. Talvez a saída do Babu tenha auxiliado neste processo. Mas, mais do que a calma, para muitos setores da nossa frágil indústria, foi ficando difícil manter o funcionamento das coisas.
Sem dúvidas, a indústria de mangás sofreu um de seus maiores baques. Com o país em crise há pelo menos 4 anos, as coisas já não andavam fáceis. Aumentos de preços, por vezes incontornáveis, já eram alvos de reclamações no ano passado. Mas a pandemia veio piorar o cenário.
Não só a logística fica mais complicada neste período – com menor movimento de comércio, fechamento de gráficas, entre outros – mas também o aumento do dólar, aliado à nula política federal de evitar o desabastecimento do mercado interno em prol das exportações, complica a compra de coisas básicas na produção de mangás impressos, como papel. O custo disso, óbvio, termina no preço na capa (ou no preço de capa colocado já considerando os eventuais descontos da Amazon).
A pandemia auxiliou o índice de desemprego a subir para 14%, fora os níveis de subemprego e emprego informal. É evidente que, vivendo dentro deste “ecossistema”, esse contexto também deve afetar o mercado de mangás (e qualquer outro).
Claro, as editoras não saem falando ao léu de eventuais demissões, mas podemos acessar algumas “pistas” deste processo – muitos vêm notando, por exemplo, as enxutas equipes nos “créditos” dos novos volumes de mangás, ao menos em comparação ao tamanho de equipe usual em edições anteriores.
No meio desta situação, no entanto, ressurge a Conrad. Sem apostar em mangás japoneses por enquanto, a editora renasce investindo forte em produção nacional, incluindo “mangás nacionais”, e no formato digital, não só uma nova possibilidade mas também uma forma de driblar parte dos custos e problemas de distribuição de livros, além de oferecer os quadrinhos por preços um pouco mais baratos.
Distribuição também é outra questão que marca o mercado esse ano. Assim como preço e papel, não é um problema de hoje, mas foi frequente a constatação de volumes rapidamente esgotados, mesmo em reimpressões feitas, justamente, para reestocar as lojas.
Claro, não só o mercado de distribuição deve ter sido afetado pela pandemia, mas também todo o contexto possivelmente afeta o investimento e a logística das editoras – convenhamos, a maioria delas são pequenas empresas, com possibilidades mais limitadas. Mas mesmo a Panini sendo uma multinacional, não significa que o orçamento brasileiro é gigantesco e, muito menos, que o setor de mangás é prioridade dentro dele.
Ainda assim, foi um ano de anúncios interessantes, marcando a chegada de séries de nicho como Given e The Flower Pot e a vinda futura de Bloom into You (popularmente conhecido como Yagakimi), além dos típicos “shonen de lutinha”, como Chainsaw Man, a volta de Nausicaä, InuYasha e Shaman King. Houve também a aposta em quadrinhos coreanos como Solo Leveling e a publicação do mangá 100% nacional de Jaspion.
Com a quarentena e o distanciamento social, as editoras também perderam um momento importante para as vendas e anúncios de volumes: os eventos. Tudo foi cancelado ou rearranjado de forma online, o que ainda pode ajudar em alguns aspectos, mas certamente não tem o mesmo peso e impacto que os eventos presenciais. Não são só elas, provavelmente todas as empresas da indústria acabam sentindo o impacto da ausência de eventos.
Mas, mesmo num momento desses, e talvez até de forma meio independente da pandemia, o cenário do streaming foi extremamente agitado ao longo do ano. Começou com a revelação dos planos da Viacom em trazer a Pluto TV, uma plataforma de streaming gratuita (com propagandas), que funciona similar à televisão: vários canais com uma programação rolando ao longo do dia.
A Pluto estava programada para dezembro, mas começou com testes algumas semanas antes. Com um canal de animês e um canal exclusivo para Naruto, talvez ainda não tenha chamado tanto a atenção do público, mas é certamente um player interessante no mercado.
Quem fez barulho mesmo foi a Funimation, ao confirmar boatos já correndo nos bastidores há um bom tempo: a vinda do serviço de streaming para cá. Com um anúncio ironicamente feito em um evento online inacessível ao público brasileiro (por ter trava de região), a Funi revelou os planos de estrear aqui e no México em dezembro, trazendo séries dubladas, um diferencial muito importante para o público brasileiro.
A estreia ocorreu em meados de novembro, antes do planejado, trazendo dublagens de queridinhos de muita gente: My Hero Academia e Attack on Titan. Apesar de alguns “tropeços” com anúncios, falta de aplicativos (prometidos para o começo de 2021) e as críticas sobre as primeiras informações das dublagens, principalmente em relação à troca de elenco em My Hero Academia (com dubladores diferentes do filme), as “versões brasileiras” e a vinda da plataforma num geral parecem estar com recepção positiva.
Contudo, o meio de dublagem sofreu na pandemia. Com um mês paralisado e mudança para home-office, muitas séries da Netflix estrearam com dublagem pendente – mas algumas não foram adicionadas por reclamação dos fãs, The Seven Deadly Sins (Nanatsu no Taizai) teve que ser redublado após uma injustificada troca de elenco.
Mas ninguém segurou a nova dublagem de One Piece, talvez a estreia do ano na plataforma, falando de animês. A série veio com tudo para tirar o gosto ruim da versão editada da 4Kids.
Não foram só elas que nos trouxeram novidades de dublagem: coincidentemente ou não, poucos meses após o anúncio da concorrente, a Crunchyroll começou com dublagens expressas – “quase simultâneas” – no catálogo. Jujutsu Kaisen e Yashahime são dois destaques da primeira leva. A empresa também realizou diversas atualizações pedidas há anos pelo público, como a implementação da opção de baixar para assistir offline (embora ao custo do aumento dos preços dos planos).
Como toda alegria dura pouco, foi anunciada a compra da Crunchyroll pela Funimation, trazendo uma pequena frustração a quem esperava melhorias advindas da concorrência, já que o caminho natural parece ser a fusão dos serviços. A história já era ventilada nos bastidores, com informações de conversas entre a Sony e a AT&T referente à negociação – com uma dívida gigante, a AT&T teria um grande interesse em vender a marca; já a Sony teria muito a ganhar com uma espécie de monopólio de serviços de streaming voltados para o nicho otaku.
Por fim, até juntando os dois serviços na sua programação, veio a Loading. Prometendo ser um canal jovem, a estreia foi cheia de erros de beabá, sem selos de classificação indicativa antes da exibição dos programas (uma exigência da lei, diga-se de passagem), programação ausente ou errada no site e até mesmo dentro do canal, com os apresentadores chamando uma atração e outra entrando no ar, ou vinhetas anunciando blocos até agora inexistentes, como o Super Hero Time. A programação no site e os selos, felizmente, já foram corrigidos.
Até mesmo a programação puxada pela (ou enviada para) Claro TV estava errada – essa foi a fonte que os veículos jornalísticos, aparentemente mais interessados que o próprio canal em informar o público, foram de certa forma forçados a usar para ter alguma informação. Sem contar o sinal vermelho do caso Metagaming, que, para além de tudo já divulgado, também indica certo amadorismo do canal com manejo de crises.
Apesar de tudo isso, a emissora parece ter entrado para a vida diária de muitos, afinal, abraça um público deixado de lado pelos canais abertos.
Com séries com apelo, como Cardcaptor Sakura (em alta qualidade e com conteúdos inéditos) e Lost Canvas, além de parcerias com Sony, Crunchyroll e Funimation (todo mundo agora da mesma família!), além de nomes no casting advindos de portais grandes como o Omelete, talvez seja natural o interesse de muitos na Loading, principalmente daqueles que não se identificam tanto com a programação atual da maioria dos canais ou até mesmo quem há 20 anos lamenta incessantemente o fim da Manchete.
Enfim, cá chegamos ao final. O ano teve tanta coisa que é difícil pontuar que agora é mesmo o final dele, parece que até às 23h59 do dia 31 muita coisa ainda poderia rolar e mudar ainda mais esse cenário e mais difícil ainda tentar prever o que 2021 no aguarda. Por isso, ficamos por aqui (ufa!) e a coluna só volta agora lá pro dia 15 de janeiro. Boas festas a todos e até a próxima!
O texto presente nesta coluna é de responsabilidade de seu autor e não reflete necessariamente a opinião do site JBox.
Não importa as novidades, todo ano algum otaku aparece falando que [tal ano] é o “ano dos animes” no Brasil :v
Mas que essas novidades surpreenderam, surpreenderam bastante, apesar dos vários tropeços que parte da indústria que tentou carregar o público nas costas sofreu.
Bem, que no próximo ano a indústria de animes (e principalmente de mangás) por aqui seja bem mais desenvolvida que antes. A Aniplex, por exemplo, demonstrou não dar a mínima pro nosso público durante anos até agora, mas com a chegada da Funimation no Brasil creio que essa situação mudará drasticamente com o tempo, e com a ajuda do Loading, pode estar bem mais perto da situação mudar.
A Pluto TV e a Vix precisam melhorar aquele catalogo, de vez em quando passo por lá, mas não tem nada que me chame a atenção. Essa onda de streaming gratuito precisa vingar pra poder ajudar pobretões como eu a viver na legalidade.
Isso porque ainda ficou muita coisa de fora. Tivemos filmes sendo lançados aqui, a Vix fazendo certa concorrência à Pluto TV, animes voltando à TV aberta pela Band e TV Cultura. Com certeza é um ano que entrará pra história dos otakus no Brasil.
Pera: animes na Band e Cultura?? Quais são?? Se n fosse vc eu n ficaria sabendo disso 😱
Então, a TV Cultura passou Sushi e Além, que terminou sábado retrasado e espero que reprisem e a Band passou As Aventuras de Hello Kitty e Amigos que ainda era inédito na TV, se não me falha a memória. Esse já estava disponível na Prime e agora também está na Pluto TV.
Além desses dois, o Cartoon passou Dr. STONE, com a dublagem estreando 24h depois na Crunchyroll e a Rede Brasil estreou Schwarzes Marken, que já tinha disponível na Crunchyroll, mas ainda era inédito na TV.
Fora os animes inéditos na TV que vieram pela Loading e outros que passaram a ser reprisados.
Com a loading fazendo barulho vai ser natural outras TVs abertas procurarem anime para recuperar o publico. – assim espero – Quanto a funimation e Crunchroll, bem que eu queria a concorrência, mas talvez a venda seja um passo para a chegada do HBO+ que estava previsto também ter animes em seu catálogo. Digamos que ele seria uma concorrência para Netflix, mas seria uma nova possibilidade de animes… sem contar que existe boatos do serviço de streaming Animeongai ser lançado tb no Brasil
Nooossa, que legal *o* Obrigada por responder 💕
Ainda tivemos os tokusatsus aos domingos na band esse ano e a treta do dublador com a sato company que fez cancelarem a exibição de kamen rider black e logo depois os demais tokusatsus sairam.
E falando um pouco dos mangás, várias editoras agiram de forma muito errada.
Me pergunto: Pra que foram melhorar a qualidade do papel de tantos mangás justo nessa epoca de crise e pandemia se sabem que isso vai encarecer muito o preço e ficar dificil de comprar?
É legal ter algo com mais qualidade? sim muito, mas não era a hora de fazer isso. Agora metade do povo que comprava 5 mangás por mês vai baixar pra uns 2 por mês, e já vi gente dizendo que vai parar de comprar. Sério, o preço da maioria ir de 19,90 pra 29,90 é muito absurdo, que segurassem no papel jornal mais um tempinho até isso tudo passar, quando estivesse mais estabilizado aí sim mudar o papel.
Outra coisa que não entendo é o momento que foram escolher pra fazer tanto relançamento aguardado, parece até que foi proposital, vários que o povo vinha pedindo foram relançar logo agora na crise, hxh, naruto, etc…
Eu acho que esse ano foi feito apenas visando lucro, deveriam ter continuado no papel que tava antes, nos formatos que estavam, e com os lançamentos mensais que já estavam acontecendo, sem nada novo, e então no ano de 2021 quando tudo isso amenizasse ai sim fariam a mudança do papel e novos lançamentos, essa é minha opinião.
Ah e pra mim a Loading é a melhor emissora aberta desde a manchete, na verdade pra mim tá melhor que a manchete que tinha muito infomercial, to torcendo muito pra esse canal crescer mais e mais.
A coluna do César na outra semana fez a retrospectiva pra Tokusatsu. :)
Sobre papel, o Cassius disse pra gente no podcast que hoje o preço de um brite e um offset não muda muito, então compensa o offset (é, tá caro…).
Em 2010 a gente nunca iria imaginar que em 2020 teriamos um mercado de animes forte e com tantas novidades aqui no Brasil, inclusive numa TV aberta que muitos davam como morta mesmo naquela época.