Transformers: O Cerco, o primeiro capitulo da trilogia War for Cybertron, teve a tarefa ingrata de ter que reintroduzir o universo clássico de Transformers e ao mesmo tempo se diferenciar de mais de três décadas de histórias.

O resultado foi um tanto desigual, com uma temporada inicial que intrigou quem já é fã, mas que pecou em acessibilidade para um público novo.

Com isso resolvido, O Nascer da Terra tem mais espaço para aprofundar seus personagens e expandir o universo introduzindo novos personagens, locais e conceitos. Mas, por ser um capítulo do meio, ele também apresenta as armadilhas de ser um ponto de transição.


O Nascer da Terra mostra as consequências da batalha final de O Cerco. Após Optimus Prime lançar no espaço a fonte de toda a vida Cybertroniana, o Allspark, os Autobots viajam pelo espaço para recuperá-lo, encontrando com diversas novas ameaças no caminho.

Enquanto em Cyberton, uma pequena guerrilha liderada por Elita-1 luta contra os Decepticons de Megatron, que com a ausência dos Autobots agora tem domínio total de Cybertron, mas também não tem mais a imagem de um inimigo para mobilizar suas tropas, cuja lealdade ao lider começa a vacilar.

De cara, essa segunda parte da trilogia se distingue da primeira tanto em tom quanto em estrutura. Enquanto a temporada anterior era efetivamente um filme de guerra dividido em 6 partes, essa está mais para uma aventura espacial episódica nos moldes de Jornada nas Estrelas.

Imagem: Facção Mercearia, um grupo novo da série (mas os modelos são reciclados de outras animações).

Reprodução: Netflix.

Com o fim da guerra, o tom da série ameniza um pouco, permitindo explorar os  conceitos mais “pirados” dos Transformers. O tom sério do não é descartado, mas agora a série se permite ser mais explicitamente fantasiosa, mais colorida, esquisita, com “cara” de desenho.

Além disso, cada episódio foca em um acontecimento distinto com começo, meio e fim, que flui organicamente para o próximo. Isso melhora bastante o ritmo da temporada em relação à  anterior, mas não consegue disfarçar a sensação de ser o capítulo do meio.

O primeiro episódio é praticamente um epílogo da trama da primeira temporada e o último não tem desfecho real, só é um gancho para a terceira. A nova série acaba sendo definido pelo que vem antes e o que ainda está por vir… algo que, intencionalmente ou não, casa perfeitamente com os temas da temporada.

A nova temporada fala de história e legados, literal e metaforicamente. Após serem separados, Optimus Prime e Megatron, que antes viviam em função do outro, são forçados a confrontar seus respectivos lugares no mundo. É aí que a injeção de mais elementos fantásticos vêm a calhar.

Na minha crítica anterior, eu havia mencionado minha frustração que a história pregressa desses personagens era apenas discutida de passagem, aqui ela é mostrada de forma criativa, envolvendo novas facções, viagens espirituais, aliens de cinco cabeças e escorpiões gigantes.

Essa diversidade de elementos mirabolantes (que você pode comprar e ter na sua casa!) é usada para retratar o passado dos dois líderes, suas relações com o mestre Alfa Trion, as experiências enquanto irmãos de guerra, mas também as possibilidades que o futuro reserva.

Sem dar spoilers, a série apresenta diversos caminhos possíveis que a jornada dos rivais podem levar, e isso também influencia o desenvolvimento deles no presente. Esses futuros possíveis são bastante familiares para os fãs, e a forma que eles interagem com a história da série é uma boa forma de usá-los sem repetir histórias que já foram contadas antes.

Também ilustra, de forma metalinguística, como toda nova versão dessas histórias acabam sendo influenciadas pelo que veio no passado, além da dificuldade de se criar uma história nova nesse universo, com as expectativas de quem tem as obras clássicas num pedestal inalcançável da nostalgia. Mas talvez eu só esteja racionalizado demais um desenho de Transformers.

Imagem: Quintesson, um dos vilões clássicos.

Reprodução: Netflix.

Uma melhoria muito menos abstrata é o destaque dado à Elita-1. Fora da sombra de Optimus Prime, ela agora tem um episódio inteiro dedicado à sua pequena facção de resistência que sabota os projetos de Megatron, além de ajudar Decepticons desertores a fugir do regime que não permite dissidências.

No pouco tempo que ela tem de destaque, ela demonstra ser uma líder muito mais eficiente que Optimus e Megatron, coisa que a temporada anterior já havia indicado. A relação dela com o líder Decepticon também é explorada, com insinuações de um possível triângulo amoroso entre os três líderes.

Novamente, é difícil imaginar como é a experiência de alguém que não é fã de Transformers e ter que digerir toda essa informação que a série joga. Vai para além das referências e easter eggs, agora são introduzidos diversos novos conceitos do universo Transformers, cruciais para a trama, mas com só algumas poucas linhas de diálogo de explicação.

Não que seja impossível de se acompanhar, mas só por garantia, eu sugeriria que quem for ver a temporada sem nenhum conhecimento prévio (além da temporada um) dê uma assistida no longa animado de 1986, só pra não ficar perdido. Vai que você gosta e vira um Transfã?

O Nascer da Terra conseguiu acalmar minhas dúvidas quanto a capacidade da equipe criativa de equilibrar o tom mais sério com uma história mais dinâmica. Apesar de reter alguns problemas do original (como animação travada e o ritmo estranho dos diálogos onde cada. palavra. tem. uma. pausa. dramática), a nova temporada é uma evolução significativa da primeira, que expande o universo para novas direções, aproveitando elementos consagrados da franquia Transformers para criar uma história nova que não perde o foco nos personagens.

Foi confirmado que Kingdom, o capítulo final da trilogia, vai introduzir os personagens da fase Beast Wars, uma das reinvenções mais drásticas da franquia, que introduziu robôs que se transformam em animais, além de um salto significativo de qualidade narrativa. O Nascer da Terra restaurou a minha confiança no potencial dessa trilogia de fazer jus à fase e, quiçá, ser uma evolução tão grande quanto.


O texto presente nessa resenha é de responsabilidade de seu autor e não reflete necessariamente a opinião do site JBox.


Recomendação da Editoria:

Ué, o que o JBox está falando sobre série americana? Só porque tem envolvimento do Polygon Pictures? Bem, a franquia Transformers tem uma bela relação com o Japão (para começar que ela tecnicamente é da Takara Tomy), que você poder ler aqui caso não saiba. Mas, sim! É também porque a produção conta com o Polygon Pictures.