Aproveitando o hype da série reboot Kamen Rider Black Sun, que estreia no próximo dia 28 pelo Amazon Prime Video, eu resolvi abordar sobre as duas versões de Issamu Minami (Kotaro Minami, no original) que aparecem em Kamen Rider Decade (2009). Percebo que boa parte dos fãs de Kamen Rider ainda se confundem quando o assunto é a coexistência entre Black e Black RX — sendo que os dois são parte de um mesmo alter ego.

Antes de explicar essa loucura toda, nós precisamos voltar ao passado para entendermos a conexão entre as séries Kamen Rider Black (1987~88) e Kamen Rider Black RX (1988~89). Ambos os clássicos, que foram exibidos na extinta Manchete, fazem parte da mesma cronologia.

Kamen Rider Black foi concebido para ser um “marco zero” na franquia e não teria ligação cronológica com as produções anteriores. Ou seja, seria outra linha do tempo onde os eventos relacionados aos primeiros 10 Kamen Riders eram inexistentes. Essa teoria não ficou na prática e a Toei, em algum momento da produção de Black, resolveu abandonar essa ideia e considerar a série como parte da mesma linha do tempo de seus antecessores. Tanto é que os 10 Kamen Riders retornaram na reta final de Black RX, firmando essa conexão entre estes heróis.

Imagem: Vários Kamen Rider.

RX ao lado dos 10 Kamen Riders veteranos | Divulgação/Toei/Ishimori Pro

Sabe-se lá por qual motivo, razão ou circunstância, os antigos Riders não apareceram quando Black estava morto e estava para ser ressuscitado pela força sobrenatural da Gruta Milagrosa, o esconderijo do Monstro Baleia. Provavelmente nunca teremos a resposta. Seja como for, foi melhor assim, pois não teríamos a mesma emoção de quando vimos Black pela primeira vez.

Black RX, apesar das mudanças em relação à série anterior, faz sim parte da mesma cronologia e não significa um “reboot” ou algo do tipo. Issamu Minami havia encontrado sua redenção após derrotar o Império Gorgom, estava mais sorridente, trabalhando como piloto de helicóptero e tratou de arrumar uma namorada. Mas há alguns pontos durante a série que justificam a conexão com Black.

A começar pelo primeiro episódio de Black RX, onde os membros do Império Crisis chegam à Terra e procuram por Issamu Minami. Eles já sabiam que o jovem é o Kamen Rider Black e pesquisaram tudo sobre ele, nos mínimos detalhes (como diria o Explicadinho, aquele personagem d’A Praça é Nossa). No momento em que Issamu já estava para se transformar, os monstros Skarma conseguiram impedi-lo a tempo.

Fora isso, a moto Patrol Hopper (Battle Hopper) havia renascido como Acrobatter ainda no primeiro episódio. A Gruta Milagrosa foi revisitada no episódio 4 para ativar o carro Raidron (Ridron). E Shadow Moon retornou nos episódios 22 e 27, sem memória e despertando o antigo pesadelo de Issamu — com direito a flashback dos tempos de Black.

imagem: 4 riders, como descritos na legenda abaixo,

Black, Bio Rider, Robo Rider e RX juntos no curta-metragem Kamen Rider: Run All Over the World | Divulgação/Toei/Ishimori Pro

Entre os episódios 23 e 24, tivemos o curta-metragem Kamen Rider: Run All Over the World (1989), que mostrou RX se encontrando com Black e suas novas formas, Robo Rider e Bio Rider, por causa de uma distorção temporal causada por Crisis, pra tentar eliminar a existência de Issamu. Até aí, tudo bem. Foi algo que ficou resolvido e a imagem de Black ficaria no passado…

…até surgir o famigerado Destruidor de Mundos!

 

A culpa é do Decade!

imagem: ilustração comemorativa com diversos riders.

Em 2006, Black não aparecia nesta Ilustração oficial comemorativa de 35 anos de Kamen Rider – já que ele “não existia mais” até então | Divulgação/Toei/Ishimori Pro

Depois do final de Kamen Rider Black RX, as imagens promocionais (como esta acima) mostravam o herói-título ao lado de antigos e novos Riders. Todos menos o Black, pois ele havia evoluído para RX.

A confusão mesmo começou em 2009, quando finalmente tivemos a participação especial de Tetsuo Kurata em Kamen Rider Decade, reprisando o papel de Issamu Minami. Ou melhor, interpretando duas versões alternativas do mesmo personagem.

Exatamente isso. Você não leu errado. Estes dois Minamis não são os mesmos das séries Black e Black RX, mas sim versões alternativas da metaficção de Decade. É claro que isso não afeta em nada as homenagens e a nossa nostalgia, mas o leitor precisa ter isso em mente quando ver ou rever a série de 2009.

Os episódios 26 e 27 de Decade, exibidos originalmente em 26 de julho e 2 de agosto de 2009, respectivamente, apresentaram um Issamu Minami de um mundo alternativo, onde ele procurava por seu amigo Joe Kazumi (a tal versão alternativa ficou apenas nas menções). No desenrolar da trama, houve um encontro deste Issamu e do Issamu do mundo de Black. As duas versões alternativas se encontraram mais uma vez no filme Kamen Rider Decade: All Riders vs. Dai Shocker, que estreou nos cinemas japoneses em 8 de agosto de 2009.

imagem: tetsuo kurata em poster (são duas fotos do ator em figurinos diferentes).

Em 2009, Tetsuo Kurata retorna para interpretar duas versões alternativas de Issamu Minami em Kamen Rider Decade | Reprodução/Toei/Ishimori Pro

Em entrevista à revista Toei Hero Max Special W Cross DECADE, o produtor Shinichiro Shirakura falou sobre uma metaficção que diferenciava o Wataru Kurenai da série Kamen Rider Kiva (2008~09) e o Wataru Kurenai de Decade. Ele explica: “No primeiro episódio (de Decade) aparece o Wataru, que nós costumamos chamar de “Wataru Seto” [se referindo ao ator Koji Seto], e começa a explicar a situação do mundo. Ali, o Wataru que o [Koji] Seto interpreta não é o personagem “Wataru Kurenai”, e sim um ser da meta-ficção. Seria algo como a voz do céu ou a voz do autor (risos)”.

O mesmo vale tanto para os dois Minamis quanto para as versões alternativas de Shoichi Tsugami (Agito), Kazuma Kenzaki (Blade), Otoya Kurenai (Dark Kiva) e até mesmo para um Kamen Rider Skull que surge no final do filme Kamen Rider × Kamen Rider Double & Decade: Movie Taisen 2010 (também de 2009).

Ou seja, nenhum deles eram os mesmos das suas respectivas séries e são todos versões alternativas. Tampouco vimos sobre o Issamu Minami que conhecemos das séries originais Kamen Rider Black e Kamen Rider Black RX na série comemorativa de 10 anos dos Heisei Riders. Ambos eram apenas representações do personagem em duas versões alternativas e com personalidades distintas.

As únicas exceções em Decade foram os personagens de Kamen Rider Den-O (2007~08) e Shinkenger (2009~10), pois são os originais de sempre.

imagem: riders de decade, rx e black.

O encontro entre os Riders Diend, Decade, RX e Black | Divulgação/Toei/Ishomori Pro

E é preciso que se diga que em livros e revistas oficiais de Kamen Rider não há uma classificação entre “Rider original” e “Rider alternativo”, uma vez que a premissa de Decade tinha os mundos alternativos dos primeiros Riders da era Heisei como base e não havia uma divisão entre o original e a série do Rider que estava só “de passagem”.

Após Decade, houve mais aparições entre dois Minamis. Como foi o caso dos filmes OOO, Den-O, All Riders: Let’s Go Kamen Riders (2011), Kamen Rider x Super Sentai: Super Hero Taisen (2012), Heisei Riders vs. Showa Riders: Kamen Rider Taisen feat. Super Sentai (2014) e Super Hero Taisen GP: Kamen Rider 3 (2015).

No primeiro citado, há uma justificativa de que os dois Kotaros vieram de pontos diferentes do tempo. Quem assistiu ao filme, teve que se virar com outro nó cego no juízo pra tentar entender isso. Foi algo similar ao filme de 1989, citado no início desta coluna.

Quanto ao segundo, nos panfletos de divulgação do Super Hero Taisen, havia uma referência de uma luta ente Black e Shadow Moon, mesmo depois de cerca de 25 anos. Supõe-se que como Decade era um dos protagonistas do longa, o Black que vimos era do seu próprio mundo alternativo, onde Issamu jamais teria perdido seus poderes.

É complicado dizer qual é o verdadeiro Minami nas recentes produções da Toei. Teoricamente falando, o mais correto e coerente seria dizer que o verdadeiro Kotaro Minami estaria na atual forma como RX. Enquanto o Black seria o alternativo.

Somente a Toei Company poderia responder essa questão de maneira oficial — e mais coerente possível, de preferência. Eis o caso inusitado que envolve um herói que continua atravessando gerações.


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