O cenário brasileiro de desenvolvimento de jogos vem crescido cada vez mais com a chegada de títulos de vários gêneros que conquistaram sucesso mundial. Os projetos são variados e muitos deles buscam, inclusive, influência em produções japonesas, como UNSIGHTED, Chroma Squad, Momodora, entre outros. Um título lançado ano passado que também visou uma mídia comumente japonesa foi NVDA — uma visual novel.
NVDA é um projeto desenvolvido pelo Studio Kraken que tem apoio da Prefeitura de Natal e do Governo Federal através da Lei Aldir Blanc. O título foi lançado inicialmente em janeiro do ano passado no itch.io, mas agora ganhou também uma versão para Steam.
Na história, acompanhamos Hugo, um estudante do ensino médio que está em dúvida sobre seu futuro, principalmente o que envolve a universidade. Hugo deseja cursar Cinema, porém a pressão social o faz se questionar se a decisão é realmente correta. Enquanto está conflitado pela situação, Hugo vê uma oportunidade em um concurso de curtas-metragens. Precisando estudar e conseguir recursos para a criação de um curta, Hugo vê uma situação complicada na manutenção de seu tempo hábil. Para agarrar tudo que deseja, ele conta com a ajuda de seus amigos, mas, assim como no Mito de Ícaro, as coisas não são simples.
NVDA, apesar de demonstrar inicialmente a premissa acima, tem como temática principal outras questões que já ficam claras assim que começamos o jogo, quando nos deparamos com a tela que indica alguns alertas de gatilho envolvendo drogas ilícitas, automutilação e suicídio.
A visual novel dividida em três atos toma bastante tempo da segunda parte para abordar a situação de Téo, o melhor amigo de Hugo. O personagem está passando por problemas em casa que o faz cair em depressão e aos poucos descobrimos o que está acontecendo (apesar do jogo não deixar toda a situação familiar que está afetando Téo muito clara).
A história visa conscientizar os leitores sobre os perigos da depressão, e consegue fazer isso bem, mas, tirando a produção do curta, outros pontos levantados durante o enredo acabam sendo deixados um tanto de lado, principalmente o assunto sobre gravidez na adolescência que surge no início do Ato 2.
Claro, é importante considerar que o jogo é um projeto independente de pequena escala, então tratar sobre todo o conteúdo poderia ficar difícil, porém a falta de uma abordagem maior sobre a questão específica levantada sobre a gravidez faz falta, ainda mais porque tinha potencial como algo interessante a se debater.
Além de Hugo e Téo, temos outros quatro personagens principais: Helô, Marina, Tales e Karlos. Entre eles, Helô e Marina também passam pelos próprios conflitos, principalmente se considerarmos que Helô é melhor amiga dos dois protagonistas e Marina é a namorada de Téo, por quem Helô também é apaixonada. Já Karlos e Tales são de fato personagens mais secundários, apesar de estarem fortemente envolvidos na produção do curta-metragem com Hugo. Em certos momentos, a dupla acaba servindo como alívio cômico, o que dá um pouco de leveza para o enredo (algo importante considerando a natureza pesada da temática do jogo).
Assim como é popular em várias visual novels, NVDA conta com um sistema de escolhas que muda o que acontece no jogo. Apesar de não entrar em “rotas” distintas, existe a possibilidade do Ato 3 ocorrer de três formas diferentes dependendo da natureza das escolhas do jogador durante os dois primeiros atos, coisa que fica basicamente entre o que é positivo, negativo ou equilibrado.
Cada versão do Ato 3 conta com três finais possíveis, fazendo com que existam nove finais ao todo — três ruins, três médios, dois bons e um perfeito. O problema é que, apesar de um ponto específico mudar bastante dependendo de qual versão do Ato 3 o jogador consegue, ainda assim a maior parte dos diálogos utilizados é a mesma, algo que se estende para os trechos finais em si, fazendo com que na prática sejam só quatro finais (isso porque o final perfeito consegue ser um tanto diferente do resto). No lançamento inicial para itch.io, foi informado que a versão contava com três finais, algo que talvez acabou só sendo reaproveitado para estender a experiência do jogador de alguma forma.
NVDA entrega um roteiro sólido, mas que poderia ser melhor aproveitado em alguns pontos. O jogo usa bem das características de visual novels para contar sua história, propondo um sistema de escolhas simples, mas funcional o suficiente para até o público mais desfamiliarizado entender.
Infelizmente, o sistema utilizado não abre muita brecha para a existência de um fluxograma de escolhas, algo bem útil que é normalmente usado nas visual novels mais atuais. No entanto, o sistema de pular falas é bem programado e consegue dar conta de entregar uma experiência fácil para o leitor pegar todos os finais sem problemas.
No fim, torço para que o Studio Kraken e outros desenvolvedores brasileiros consigam futuramente ter recursos para a criação de projetos mais ambiciosos no mundo das visual novels e assim reforçar ainda mais o potencial do Brasil no cenário mundial de games.
NVDA já está disponível para PC via Steam, com preço “de capa” de 14,99 reais. O Studio Kraken forneceu gratuitamente uma cópia do jogo para a produção desta resenha.
O texto presente nesta resenha é de responsabilidade de seu autor e não reflete necessariamente a opinião do site JBox.
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