No finzinho de dezembro do ano passado, descrevi 2021 como uma “segunda temporada” de 2020. Com a pandemia mundial da COVID-19, cada dia de 2020 era como uma morte do Subaru, voltando do mesmo ponto repetidas vezes e com poucas chances de variação.

Em 2021, as mudanças engatinharam. Graças às vacinas. O coronavírus já não era mais um vilão invencível. E em 2022, o mundo já nem parece o mesmo de quando precisávamos nos isolar e nos assustávamos sempre que alguém próximo espirrava. É uma nova temporada.

O que se mantém disso tudo é a impressão de que, em tempos de guerra, a arte nos serve como uma válvula de escape. Ela nos leva para lugares diferentes, nos emociona, nos intriga. No universo dos animês, pudemos nos amparar para esse escapismo através de histórias nas temáticas mais diferentes e para uma grande variedade de públicos.

E já é fim de ano novamente. E fim de ano é época de montarmos nossas listas com aquilo que mais curtimos nele. Fechar uma lista só com 10 animês foi bem difícil, já que saiu muita coisa legal de janeiro pra cá – principalmente nessa última temporada de outono!

Para ela, então, foram considerados apenas animês seriados e que tenham estreado no ano de 2021. Continuações, como as de Kaguya-sama: Love is War, Pokémon: Jornadas, Ranking of Kings e Mob Psycho 100, todas excelentes, não foram levadas em conta. Dance Dance Danseur e Fuuto PI quase chegaram lá. Já o “fan favorite” My Dress-up Darling sequer foi considerado, mas a barra de comentários está sempre aberta para que você também compartilhe quais os seus prediletos do ano.

Vamos lá…


10. Akiba Maid War

(Souichi Masui, P.A. Works)

imagem: screenshot de akiba maid war.

Esse aqui comprova que mesmo os temas mais dadaístas podem render séries realmente bacanas. Em Akiba Maid War, o roteiro parte de uma pergunta que me questiono o porquê de nunca ter cogitado: e se o universo colorido e cintilante dos Maid Cafés japoneses, na verdade, fosse uma fachada para um submundo da máfia onde essas empregadas lutam entre si?

A trama tem início a partir do ponto de vista de Nagomi Wahira, uma menina cujo sonho era se tornar uma maid. Quando a jovem consegue o emprego tão esperado, descobre o quão violento, sanguinário e assustador é a máquina que opera esse mundo por baixo dos panos. O resultado é um animê de gangues meio John Wick, meio Edgar Wright, deliciosamente surreal, agridoce e recheado de segmentos icônicos (a chacina de coelhinhas no primeiro episódio é maravilhosa). Vale ser descoberto.

Indisponível no Brasil, acessível apenas pelo HIDIVE nos EUA e territórios da América Latina e na Crunchyroll de Portugal.


09. Cyberpunk: Mercenários

(Cyberpunk: Edgerunners, Hiroyuki Imaishi, Trigger)

imagem: cena de beijo em cyberpunk mercenários.

No fundo, essa é uma história sobre o cara querer ficar com a garota. Claro, com uma trama política crítica às privatizações, que denuncia o quão terrível pode ser a vida das classes mais baixas quando não amparadas pelo Estado, mesmo num futuro de tecnologia avançada. Mas o fio condutor é aquele sentimento juvenil de descobrir o amor pela primeira vez e, nisso, começar a se desenvolver como adulto.

Cyberpunk: Mercenários utiliza todas as batidas desse braço da ficção científica para representar o coming of age de David Martinez, um moleque de família pobre, que passa por tragédias terríveis e encontra na figura de Lucy e de seu grupo de mercenários cyberpunks uma válvula de escape. O diretor Hiroyuki Imaishi (Gurren Lagann, Kill la Kill) costura a trama numa animação de cores neon exuberante, com cenas de ação impressionantes e segmentos dramáticos bastante emotivos. Ainda outra pérola (entre tantas) do estúdio Trigger.

Disponível na Netflix.


08. SPY x FAMILY

(Kazuhiro Furuhashi, Wit Studio, CloverWorks)

imagem: yor, anya e twilight em spy x family.

A piada sobre SPY x FAMILY, na verdade, ser uma propaganda de incentivo ao aumento da natalidade no Japão é ótima, pois o animê, de fato, vende bem a ideia de ter uma família. Porém, com uma família que não é exatamente, ahn, “convencional”. Ela é montada por um espião infiltrado, Loid, que assume o lugar de pai, adota uma menina, Anya, que tem o poder de ler mentes e sabe estar numa família de fachada, e contrata Yor para ser sua esposa e mãe adotiva da menina, mas sem saber que a mulher é uma assassina profissional. E ainda tem um cachorro com o poder de ver o futuro!

Isso tudo para executar um plano mirabolante: fazer com que Anya se destaque o suficiente na escola para que a família comece a frequentar os mesmos círculos sociais de um figurão que pode instaurar uma guerra entre duas nações. O lance é que, mesmo com tudo colaborando para que os resultados sejam os piores possíveis, os personagens conseguem fazer essa família acontecer. E o roteiro conta isso com uma dose extra de canastrice, como se tudo fosse uma enorme paródia de séries de espiões de TV de décadas atrás. Um animê recheado de coração que coloca um sorrisão na cara daqueles que o assistem.

Disponível na Crunchyroll.


07. Sabikui Bisco

(Atsushi Ikariya, NAZ, OZ)

imagem: cena de sabikui bisco.

Sabikui Bisco parece um produto fora de seu tempo. Um animê de aventura num cenário fantasioso em que os personagens, originalmente, são desse mundo em vez de NEETs que morreram e renasceram nele? Em que ano estamos, 2002 em vez de 2022? A trama se passa num Japão pós-apocalíptico coberto por uma poeira feita de ferrugem que corrói coisas e pessoas como uma doença. Nesse cenário, um arqueiro andarilho e um médico se juntam para encontrar um cogumelo que especulam ser capaz de curar a corrosão da ferrugem que está se espalhando.

Tudo aqui está em seu lugar, dos designs de personagens criativos aos cenários misturando um futurismo colorido com pedaços enormes de areia desértica, das pequenas histórias paralelas intrigantes aos passos mais agressivos tomados em sequências de ação. Mas o tesouro em Sabikui Bisco está na relação da dupla de protagonistas, a cumplicidade deles é bonita, a amizade que eles constroem é contagiante, e a tensão sexual em alguns momentos adiciona ainda outra camada ao contexto todo. Gostinho de animê velho em animê novo. Por mim, tudo ótimo!

Disponível na Crunchyroll.


06. Bocchi the Rock!

(Keiichirou Saitou, CloverWorks)

imagem: garota de cabelos rosa tocando guitarra em bocchi the rock.

A vida escolar, e a adolescência num geral, pode ser bem difícil para pessoas com dificuldade em socializar. Esse é o caso de Hitori Gotou, que não consegue iniciar amizades durante o ensino fundamental. A menina, porém, decide investir seu tempo e atenção na guitarra de seu pai, e se torna uma exímia musicista com o passar dos anos. E ela espera que, agora com esse novo talento, ela possa formar uma banda no ensino médio e, assim, fazer amigos no processo.

Isso não ocorre, Gotou segue como a antissocial da classe. Contudo, calha de seu caminho se cruzar com o da positivíssima Nijika Ijichi, que já tem uma banda, mas precisa de uma guitarrista para cobrir uma ausência para um show. A partir daí, Gotou finalmente conquista seus sonhos de fazer parte de uma banda e fazer amizades no processo. Bocchi the Rock! é um dos animês mais tocantes e divertidos desse ano. A direção ousa com as possibilidades estéticas dentro de uma animação para ilustrar a fobia social da protagonista. É daquelas obras que mostram que a vida, no fundo, pode ser muito bonita — e através do rock’n’roll, o que é ainda melhor!

Disponível na Crunchyroll.


05. Blue Lock

(Tetsuaki Watanabe, 8bit)

imagem: yoichi em blue lock.

Blue Lock é um animê… escroto. E é justamente o fato dele ser assumidamente assim que o torna tão legal. É comum animês de esporte explorarem mais o lado do “espírito esportivo” e do trabalho em equipe nesse universo, mas o roteiro aqui coloca uma dose extra de empenho na competitividade, na individualidade e na construção de um “astro” acima de todo o resto. O resultado é uma peça estranha e magnífica entre seus pares.

Na história, inspirados pelos fracassos da seleção japonesa em suas participações em Copas do Mundo, um núcleo governamental instaura um programa “battle royalepara criar o artilheiro que levará a seleção japonesa à vitória do mundial no futuro. Nessa competição, 300 jogadores do ensino médio entram, um sai como o vencedor e os 299 restantes eliminados serão proibidos de tentar uma vaga na seleção dali em diante.

Disponível na Crunchyroll.


04. In the Land of Leadale

(Yuuji Yanase, Maho Film)

imagem: cena de land of leadale.

Já esse, é um animê sobre segundas chances. Deve ser algo inerente ao ser humano imaginar como a vida poderia ser melhor caso renascêssemos num outro lugar, num outro tempo, e com uma porção de vantagens já de cara. É o caso da protagonista de In the Land of Leadale. Em sua vida “real”, Keina Kagami passou anos presa a uma cama de hospital, onde seu único entretenimento era o MMORPG de realidade aumentada World of Leadale, que ela joga através de óculos de VR.

Dado dia, por conta de um apagão na cidade, que desliga os aparelhos que a mantinham viva, Keina morre, mas renasce, justamente, no mundo do game. E ela possui todos os itens e níveis conquistados em seus anos como jogadora, sendo uma figura imbatível naquela realidade. Essa é a oportunidade para a jovem viver ao máximo o que não pode antes. Uma história tocante em sua positividade, e um ponto fora da curta em meio a tantos isekais que parecem perdidos numa mesma fórmula.

Disponível na Crunchyroll.


03. Lycoris Recoil

(Shingo Adachi, A-1 Pictures)

imagem: cena de lycoreco com alguem olhando foto das protagonistas no celular.

Lycoris Recoil é um produto que consegue ser excelente em, basicamente, todos os pontos em que se propõe. Enredo, roteiro, trabalho de animação, subtexto político, críticas sociais, construção de romance: tudo é executado com um primor impressionante. No animê, o governo japonês cria a Lycoris, uma organização fascista onde garotas são criadas como assassinas para se livrarem, por baixo dos panos, de criminosos e terroristas que possam ameaçar a segurança do Japão.

No entanto, a mais talentosa dessas, Chisato, decide se aposentar desse papel e ir trabalhar no LycoReco, um café de faixada montado pela Lycoris. Quando uma outra menina, Takina, é enviada para lá por desobedecer ordens numa missão importante e colocar suas aliadas em perigo, as visões de mundo das duas são colocadas em conflito. São dois lados que podem ser nomeados das mais variadas formas: “direita” contra “esquerda”, “sistema” contra “humanitarismo”, “mecanização” contra “humanidade”. E lá no fundo, deixa na cabeça o quanto o mundo seria melhor sem… violência. Animê extremamente importante, mas cujo maior mérito é ser espetacular do início ao fim.

Disponível na Crunchyroll.


02. Shikimori’s Not Just a Cutie

(Ryouta Itou, Doga Kobo)

imagem: os casal de namorados em shikimori.

O animê com o roteiro mais bonito de 2022. A premissa até que é simples: Izumi e Shikimori formam um casal diferente. Ele é o “kawaii”, o “fofo” da dupla, que conquista os outros pelo quão atrapalhado e sobrenaturalmente azarado é. Ela, a “kakkoi”, a “cool” da dupla, que intimida todos ao redor, e age como protetora do namorado nas situações ruins em que a falta de sorte dele o coloca.

Só que esse romance é só o engate para que tenhamos um recorte idílico da época escolar dos personagens. A turma de amigos no qual o casal está inserido vive o dia-a-dia estudantil em experiências que fortalecem essa amizade, criam memórias que ficarão para a vida e ajudam com que eles se desenvolvam como pessoas. É utópico, eu sei. A fase escolar na vida real, no Japão e aqui no Brasil, está longe de carregar essa magia. Porém, tudo é tão legal de assistir, os segmentos são todos tão bacanas, que é impossível não abrir um sorriso ao fim de cada episódio.

Disponível na Crunchyroll.


01. Chainsaw Man

(Ryū Nakayama, MAPPA)

imagem: denji como chainsaw man.

O estúdio MAPPA tinha um problema em mãos: Chainsaw Man já era um fenômeno bem antes de anunciarem sua adaptação em animê. Um fenômeno daqueles em que os fãs criam, em suas cabeças, um “canon” de como ele deveria ou não ser em tela. Desse modo, seria mesmo impossível agradar a todos. Mas a uma parcela bem grande eles agradaram. Pois o Ryū Nakayama fez aqui o que bons diretores devem fazer: entregou uma obra excelente, tendo como base o material original, também excelente.

Sob sua visão, a história de Denji & cia ganhou ares cinematográficos. Ele brinca com ângulos, com enquadramentos, com cortes em momentos decisivos. Isso dá à história do Homem-Motosserra uma dinâmica visual muito instigante de acompanhar. A cena com a Himeno tentando fazer sexo com o Denji é de engolir seco. O segmento em que o Hayakawa finalmente desembainha sua espada, mas isso não é o suficiente para derrotar o vilão, é um baque forte que desvia a rota do que achávamos que sabíamos da trama até ali. E quando a Makima, enfim, usa seus poderes… é uma parte inteira de se espantar.

Chainsaw Man é impecável como produtão pop. É um exemplar que evidencia o quanto uma boa direção pode elevar ainda mais algo que, no original, já era legal. É aquele pipocão com um apuro artístico maior que a média. Que ótimo estar vivo num presente onde a principal animação voltada a um público grande traz esse nível de qualidade. E o futuro? O futuro é… ah, vocês já sabem!

Disponível na Crunchyroll.


E os piores?

Até hoje tenha a impressão de que Shuumatsu no Harem foi uma grande piada que eu não entendi; a história de Tekken: Bloodline até parece interessante, mas a animação em CGI não é fluida o bastante, então é bem difícil de assistir; o mesmo para Orient e Lucifer and the Biscuit Hammer, com o porém de que esses nem em CGI são.


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