O corpo humano sempre gerou grande interesse nas pessoas e em especial nos artistas. Não por acaso o Homem Vitruviano de Leonardo da Vinci continua sendo estudado por representar um ideal de beleza e harmonia na estrutura corporal do homem. Só que o corpo não é belo e perfeito. Ele sofre transformações, violências e mudanças ao longo do tempo que geram medos e angústias.
Por isso, o body horror (ou horror corporal) causa tamanha curiosidade por parte de artistas e admiradores desse gênero. E no mundo dos mangás, Junji Ito é muito provavelmente o nome que mais trabalha esse tema.
Em Dismorfos, o autor reúne alguns dos seus principais contos sobre os medos causados pelo corpo humano. Esta é mais uma coletânea de “contos favoritos do autor” publicada pela editora Pipoca & Nanquim, que trouxe anteriormente o ótimo Calafrios.
Foto: Pedro Vieira/JBox.
Entretanto, por mais que Calafrios traga um panorama mais geral das histórias criadas por Ito que mais o agradam, as tramas de Dismorfos se mostram mais envolventes que as da coletânea anterior. A sensação de antecipação (sabemos que algo ruim com o corpo humano vai acontecer) causada pelas histórias instiga o interesse do leitor e o levam a experimentar aquele terror junto dos personagens.
Cada conto é uma pequena viagem a uma dimensão de terror que encanta e a assusta. Nesse processo, na maioria das vezes, Ito consegue criar narrativas que unem de forma eficiente diferentes eventos em uma lógica que, ainda beirando ao absurdo, se mostra bastante criativa.
Entretanto, a dismorfia aqui vai além do corpo. O próprio psicológico dos personagens é bastante violentado, machucado ou atormentado. Eles vivem com diversos transtornos, como manias de limpeza ou obsessão pela beleza, que acabam por destruir parte de seus corpos ou o das pessoas ao seu redor.
O ápice desse dismorfismo que une o físico e o psicológico é representado nas duas protagonistas do conto “A Mulher que Sussurra”, um dos mais envolventes dessa coletânea. Aqui, Ito une o suspense ao drama para criar personagens com os quais nos importamos a ponto de nos causar certa tristeza por sabermos que o destino delas está longe de alcançar qualquer tipo de final feliz.
O horror corporal de fato combina com o estilo de desenho de Ito: o mangaká consegue criar imagens com sombras fortes e feições angustiantes que reforçam o impacto de suas narrativas.
Foto: Pedro Vieira/JBox.
Claro que uma coletânea sempre tem seus altos e baixos. Nesse caso, o elo fraco é o conto “Rumores”, no qual o autor resgata alguns protagonistas de obras passadas. Apesar da premissa interessante (trata inicialmente dos rumores que circulam uma escola), a história acaba somando diversos temas em sua narrativa que não se encaixam perfeitamente e sua evolução acaba se transformando numa bagunça.
Trazendo novamente sessões com comentários do autor e um acabamento em capa dura caprichado, Dismorfos é uma divertida, envolvente, e por vezes espantosa aventura pelo universo de possibilidades dos horrores que podem afetar o corpo humano das maneiras mais peculiares possíveis.
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Esta resenha foi feita com base em edição de Calafrios cedida como material de divulgação para a imprensa pela editora Pipoca & Nanquim.
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