Tenho que admitir que, apesar de sempre ter tido curiosidade, igualmente tive um certo receio de ver como os “mangás sobre o Louvre” abordavam o tema. Claro, não posso falar por todos, mas o receio vinha das histórias serem apenas um vislumbre qualquer do museu, mesmo que os autores responsáveis por esses títulos sejam de extremo renome. Por isso acabei sendo pego de surpresa quando abri Os Gatos do Louvre e notei que se tratava muito mais de uma história sobre família e luto do que sobre artes plásticas.
Os Gatos do Louvre é um dos mangás que compõem a série de obras que o Museu do Louvre lançou em parceria com mangakás renomados. E o que não falta é renome em Taiyo Matsumoto. Ele é conhecido por obras como Tekkon Kinkreet, Ping Pong, Gogo Monster, entre outros mangás que são bastante estimados pela crítica, então é um nome ideal para ficar ao lado de Hirohiko Araki, Jiro Taniguchi e Naoki Urasawa (outros autores da “coleção”).
Foto: Teke/JBox.
Na história, acompanhamos a situação de dois grupos: os gatos que moram no sótão do Museu do Louvre e humanos que trabalham por lá e, claro, como tudo isso acaba sendo interligado ao longo da obra.
No lado dos gatos, o foco cai principalmente em Filho da Neve, um gato que, apesar de já estar na metade de sua vida, ainda parece um filhote. Ele constantemente explora as noites do museu e acaba sendo repreendido por isso pelos outros gatos, chegando até mesmo a ser ameaçado de morte por um deles.
Todo o alerta é devido ao fato de que se algum humano que não saiba que eles moram ali descobrir sobre a presença deles, todos podem acabar “desaparecendo”.
Já o drama envolvendo os humanos também envolve desaparecimento, já que Marcel, um dos guardas noturnos do Louvre, desde criança procura sua irmã que um dia entrou em um dos quadros do museu e nunca mais foi vista.
Certa vez, Cécile, que trabalha durante o dia como guia das exposições, acaba descobrindo a história de Marcel e decide ajudá-lo a encontrar o quadro em que a irmã dele desapareceu.
É principalmente a partir dessa busca pela irmã de Marcel em que vemos mais o lado da história com mais foco em contemplar o Louvre, já que algumas pinturas são mostradas durante o mangá para mostrar possíveis lugares em que ela possa ter desaparecido, sem falar que acompanhamos também a arquitetura do local, algo visto também através de Filho da Neve.
A seleção dos quadros explorados é concentrada, então temos a chance de ler de forma um pouco mais detalhada sobre alguns deles. Sem falar que o mundo dos quadros parece se misturar várias vezes com a história da obra, não só dos humanos, mas também dos gatos, já que Filho da Neve também têm o “poder” de entrar no mundo dos quadros.
É através dessa conexão de Filho da Neve com a irmã de Marcel que as histórias se conectam, mas até lá as coisas não são tão simples, porque o gato precisa lidar constantemente com seus próprios problemas. Além dos perigos ao seu redor — que envolvem não só os humanos –, ele precisa lidar com os problemas dentro de si mesmo, já que o gato parece não saber qual é o seu lugar no mundo, por isso “nunca conseguiu crescer”.
Enquanto isso, os outros gatos já contam com seus próprios meios de levar a vida, o que parece afetar mais a situação dele, principalmente porque é constantemente criticado ou visto com pena pelos outros, e fica mais extremo no caso de Serrote, que sente que Filho da Neve irá levar perigo para todos os gatos do Louvre e, por isso, quer matá-lo.
Foto: Teke/JBox.
Os Gatos do Louvre intercala constantemente entre esses momentos da história de forma consistente, só que não de uma maneira muito interessante.
Pela maior parte do tempo, o drama de Marcel em busca da irmã não consegue ser instigante e as decisões da história parecem adiar a conclusão desse ponto específico do roteiro em prol de explorar melhor o lado dos gatos enquanto isso, que até instiga mais a curiosidade porque a relação de Serrote com Filho da Neve e os outros gatos é legal de acompanhar, mas também não vai muito além disso.
A conclusão de ambos os lados do roteiro é bem executada, porém algumas partes do processo até lá, muitas vezes, é meio descartável. Mesmo com apenas dois volumes, a história não soa concisa o bastante.
Por outro lado, Os Gatos do Louvre se sai muito bem em repassar a sensação de mortalidade e luto que envolve a história, tanto entre humanos quanto entre gatos. É palpável em Marcel o quanto a busca de 50 anos por sua irmã está o consumindo, muitas vezes dando a entender que, mesmo que ele persista nisso, ele meio que já aceitou a perda.
No lado dos gatos, através da escolha artística de retratá-los com aparência humana em algumas situações (o que pessoalmente não achei necessário), conseguimos observar vário sentimentos nas expressões de vários deles, como a melancolia do Filho da Neve, o misto de raiva e preocupação em Serrote e a aflição que os cerca quando se trata dos perigos de perder entes queridos. O problema em si é que a parte escrita da história fica devendo demais, por mais que haja uma clara tentativa, e passa a impressão que se o mangá tivesse menos diálogos ele se sairia melhor, o que também bate de frente com a questão do roteiro não ser muito conciso no que propõe.
No fim das contas, Os Gatos do Louvre é um mangá que acerta o clima que o roteiro propõe através das ilustrações, mas infelizmente o roteiro geral não se equipara e não convence o leitor de que vale a pena acompanhar o drama daqueles personagens.
O misto de laços familiares com a visão da mortalidade é amplificado em cada expressão dos personagens e também através dos quase aterrorizantes cenários dos corredores do Louvre durante a noite, contudo existe um persistente gostinho de que poderia ser bem mais caso houvesse um melhor trabalho na escrita. É um conto que seria melhor aproveitado se fosse apenas uma bela pintura.
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Galeria de fotos
Confira nos álbuns abaixo alguns registros da edição nacional de Os Gatos do Louvre.
Volume 1
Volume 2
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Essa resenha foi feita em parte com base nas edições cedidas como material de divulgação para a imprensa pela editora JBC, que disponibilizou todos os dois volumes da obra ao JBox.
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