Na primeira metade da década de 1990, o Brasil vivia um período de intenso desânimo. Tudo teve início com a criação do estapafúrdio Plano Collor, que confiscou a poupança da população brasileira a partir de março de 1990 e acabou com boa parte do investimento em diversas áreas do entretenimento, incluindo o fechamento da Embrafilme e praticamente aniquilando com a produção do cinema nacional. Na televisão, não foi diferente. Com pouca grana para investimentos, poucas apostas certeiras vingaram naquele começo de década e se refletiram em vendas — a novela Carrossel, no SBT, e a Família Dinossauros, na Globo, foram exceções.
No campo das produções japonesas, o que realmente nos interessa por aqui, minguaram na programação da Rede Manchete algumas séries tokusatsu até abril de 1993 na Sessão Super Heróis, em sua fase matutina, além de uma exibição relâmpago de Doraemon no Clube da Criança.
Na Record, as séries da Oro Filmes (Goggle V, Machineman e Sharivan) e alguns animês, como Esquadrão do Espaço e Thunderbirds 2086, eram o que tinha para o público. Na CNT/Gazeta, mais velharia, com os animês da distribuidora Network (Pirata do Espaço, Guerra das Galáxias, e Don Drácula). De novidade mesmo, nada.
Além dessa completa falta de novos conteúdos, o país vivia um período de tristeza galopante, graças ao trágico acidente que ceifou a vida de Ayrton Senna ao vivo nas televisões de todo o país. O cortejo do piloto produziu cenas que nunca mais saíram das retinas de quem acompanhou todo aquele clima absurdo de consternação, talvez nunca mais equiparado midiaticamente. Mas novos ventos começaram a soprar a partir do segundo semestre.
A Copa do Mundo, com a campanha vitoriosa da Seleção Brasileira conquistando o tetracampeonato após 24 anos de jejum, aliada ao Plano Real, um sinal de que a economia parecia finalmente começar a entrar nos eixos, deu um novo ânimo ao país. Parece que toda aquela tristeza que vinha sendo acumulada desde o início da década, e que culminou com a partida de Ayrton Senna, começou a se diluir gradativamente ao longo do segundo semestre. E foi logo depois do tetra do Brasil — um dia depois! — que as novidades começaram a chegar para quem gostava de conteúdos japoneses.
O casamento oportuno entre os heróis metálicos do Japão e a economia brasileira
Hoje, 18 de julho de 2024, completam exatos 30 anos da estreia do Esquadrão Especial Winspector no Brasil. Uma tentativa da Tikara Filmes (ex-Everest Video) de novamente se posicionar no mercado, o seriado teve a mão da Glasslite para chegar até a Rede Manchete.
Em um contrato assinado em fevereiro de 1994 com a Toei Company, garantindo direito de exploração comercial da série por 7 anos (portanto, até 2001), Winspector iniciou sua trajetória no Brasil no ingrato horário das 19h30. Ingrato por dois motivos: concorria diretamente com a audiência do fenômeno A Viagem, novela das 19h da Rede Globo, e também por ser um horário local da Manchete, já que não eram todas as praças do país que transmitiam a série. Mas isso durou pouco.
Ainda no final de julho, Winspector foi colocado em horários mais aprazíveis para o público infantil poder assistir às aventuras de Lyuma Ogawa e sua equipe. Com exibições dentro do Dudalegria pelas manhãs e durante as tardes, o seriado logo ganhou a companhia da Estrela Fascinante Patrine, outra aposta do empresário Toshihiko Egashira para conquistar o público brasileiro — essa não deu muito certo.
Apesar de ser a nona série Metal Hero a ser exibida no Brasil, ela ainda assim trazia algumas novidades. Se o visual era quase um copia/cola de Jiban, a série antecessora, os roteiros foram muito mais elaborados. Trazendo conflitos urbanos e a criminalidade das grandes metrópoles como o grande mote da série, Winspector acabou com a lógica de “monstro do dia”, com a equipe atuando em investigações, resgates e usando maquinário pesado para livrar inocentes de enrascadas.
Com relevantes índices de audiência no período da tarde, que chegavam até a 4 pontos no IBOPE (equivalente a 160 mil casas na grande São Paulo), Winspector era um excelente produto. No Dia das Crianças de 1994, as lojas estavam inundadas dos produtos da Glasslite sobre a série, dividindo as atenções com um pessoal que tinha chegado em setembro na mesma Manchete: Os Cavaleiros do Zodíaco.
Essa sinergia entre as séries para alavancar a venda de brinquedos e aumentar a audiência despertou a concorrência: a Rede Globo trouxe os Power Rangers para a sua programação em janeiro de 1995. Quem ganhou com isso foi a Samtoy, que aproveitou a onda que já havia criado com os Cavaleiros para vender também os brinquedos Bandai dos heróis coloridos da Saban.
Foi uma ótima jogada de todos os envolvidos apostar no segundo semestre de 1994, com o Plano Real nadando de braçada e recolocando a economia brasileira nos eixos após periclitantes períodos de hiperinflação nos anos anteriores. O dólar valia menos que o real e as importações ficaram muito mais baratas e acessíveis. Era possível importar os brinquedos e moldes direto do Japão e o custo ainda seria menor do que uma produção totalmente local.
A Glasslite fez isso e lançou uma belíssima coleção de brinquedos de Winspector idênticos aos da Bandai japonesa, além de sua própria versão em sofubis, os populares bonecos de vinil. Assim continuou durante todo o ano de 1995 lançando novidades, concorrendo diretamente com as importações da Samtoy, impulsionadas pelos famigerados bonecos Power Rangers “Vira-Cabeça” e os bonecos das sagas de Asgard e Poseidon dos Cavaleiros do Zodíaco.
Na parte de home video, a Intermovies entrou na parada e lançou praticamente a série completa de Winspector em VHS – foram 23 volumes, incluindo os episódios finais, durante 1994 e 1995. A distribuidora virou basicamente a nova casa das séries tokusatsu para as locadoras, graças ao relançamento das fitas de Jaspion, Changeman e Flashman, além do lançamento de Ultraman em parceria com a Sato Company.
Tokusatsu dá lugar ao animê
A chegada de Winspector à Manchete e os aparentes bons resultados para a Glasslite geraram frutos: a estreia da continuação direta da série, Solbrain, em junho de 1995, além de outra continuação, Kamen Rider Black RX, sucessor direto de Black Kamen Rider (uma aposta da finada Everest Video em 1991).
As séries também tiveram episódios lançados em video pela Intermovies. Brinquedos dos novos seriados foram colocados no mercado, até o público determinar que a nova onda eram os animês, graças ao sucesso estrondoso dos Cavaleiros. Assim, a Tikara deixou de apostar no filão das séries tokusatsu e voltou ao seu “pecado original”: as animações japonesas, que começou a trabalhar em 1986, quando ainda era Everest Video.
A partir de 1996, vieram Shurato e Yu Yu Hakusho. Shurato teve uma linha gigante de produtos da Glasslite, incluindo uma série de reaproveitamento de brinquedos antigos de linhas dos anos 1980, incluindo Voltron e Thundercats. Yu Yu Hakusho já não teve a mesma sorte e ficou apenas com bonecos feitos pela Estrela. Foram os últimos produtos trabalhados pela Tikara, já que Ranma ½ ficou engavetado e nunca viu a luz do dia.
Winspector foi exibido na Manchete de maneira praticamente ininterrupta de julho de 1994 até dezembro de 1997, quando fazia parte das manhãs da emissora. Nunca mais foi exibido de maneira oficial. Os dois primeiros episódios, com legendas em inglês, encontram-se disponíveis no canal da Toei Company no YouTube.
O sucesso de Winspector entre o público daquela época foi contemplado com a vinda ao Brasil — finalmente — do ator Masaru Yamashita, intérprete do protagonista Lyuma Ogawa/Fire. Junto dele, seu parceiro na série seguinte, Solbrain, o ator Koichi Nakayama, intérprete de Solbraver, também veio ao Brasil para o Anime Friends desse ano. É mais uma prova do quão queridas essas séries são para o público e uma oportunidade para os atores sentirem o clamor popular durante o evento. Além disso, é emblemático que seja justamente no dia 18 de julho, data exata dos 30 anos da estreia no Brasil, que isso aconteça — embora isso deva ser uma mera coincidência e não premeditado.
Considerada a última grande tentativa mercadológica de emplacar tokusatsu no Brasil nos anos 1990, Winspector atingiu seu objetivo por um curto período, a ponto de ser responsável por trazer no mínimo mais duas séries ao Brasil. Apesar de não passar nem perto do impacto que Jaspion e Changeman tiveram em 1988 para abrir os caminhos, a turma liderada pelo Chefe Masaki merece ser lembrada como um produto muito simpático, que fez a alegria de muitos durante a época das vacas magras na televisão. Fica a sugestão para ser lançada oficialmente em algum streaming junto com Solbrain.
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