Tenho duas opiniões sobre Dragon Ball que, possivelmente, são consideradas polêmicas. A primeira é a de que o animê Dragon Ball GT, de 1996, passa longe de ser ruim. Pra mim, é uma obra divertida, com uma animação bem legal, uma paleta de cores diferente do usual na franquia e que vende bem uma sensação de “estranho” ao resto. É uma história com mais altos que baixos que resgata o espírito aventureiro original do início do mangá, além de dosar a “balança de poderes” entre personagens e vilões.
A segunda é a de que Dragon Ball Super, desenho de 2015, periga ser o pior negócio já feito com a franquia. Em boa parte do tempo, a qualidade da animação é precária, as premissas das sagas são todas péssimas, os desenvolvimentos são ainda piores. E há um espírito meio pré-adolescente (no pior sentido possível) nas megalomanias presentes ali. Vilões deuses que são entediantes de tão inimaginavelmente poderosos, escaladas de poder nas transformações de super sayajins, e por aí vai. Há um segmento onde aparecem esferas do dragão que são do tamanho de planetas. Quando tudo fica grandioso demais, a graça simplesmente desaparece.
Então, é uma surpresa extremamente positiva que Dragon Ball Daima, novíssimo animê da franquia, ainda em lançamento pela Toei Animation, soe tão fresco e pareça ter se inspirado em GT para corrigir problemas de Super. Até então, são só 10 episódios, e talvez isso mude mais pra frente (animês da Toei costumam ter muitos episódios), mas a série é um sopro de vida em entretenimento, e em despertar aquele espírito de “aventura shounen contagiante” que as melhores coisas de Dragon Ball costumavam ter.
A trama se passa um tempinho após o final da saga do Majin Boo. Lembra que o Dabura, o rei demônio, tinha sido controlado pelo Babidi, e que depois foi derrotado pelos heróis da Terra? Nisso, ficou um vácuo de poder no mundo dos demônios. Então, o segundo no comando, Gomah, com ajuda de seu conselheiro, Degesu, decide tomar a coroa. Só que, com medo de ter seus planos frustrados por Goku e cia, que foram capazes de derrotar não só o Dabura, como o Majin Boo, o agora Rei Gomah vai à Terra e usa as Esferas do Dragão para transformar todos que participaram na luta contra os vilões em… crianças. E aqueles que já eram crianças, como o Goten, o Trunks e o Dende, viram bebês.
O Rei Gomah, então, sequestra o Dende para que as Esferas do Dragão da Terra não possam mais ser usadas. E cabe agora à turma ir ao mundo dos demônios resgatar o bebê namekuseijin. Para isso, eles contam não só com a ajuda do Supremo Senhor Kaio-Shin, que é do mundo dos demônios e tem uma nave capaz de levá-los para lá, como de Glorio, um misterioso forasteiro com suas próprias motivações para se meter nessa história e ir contra o Rei Gomah.
Glorio leva Goku e Shin em sua nave para o mundo dos demônios. Bulma, Vegeta e Piccolo, um tempo depois, são trazidos para lá, e a aventura segue com eles explorando o local, se jogando num plano para conquistar as Esferas do Dragão desse mundo, e enfrentando os inimigos e ocasiões que aparecem pelo caminho. Isso com a ajuda de Panzy, a princesa do Terceiro Mundo, seu pai, o Rei Kadan, e Hybis, um soldado atrapalhado, mas extremamente inteligente e de confiança.
O grande trunfo de Daima, até então, é conseguir desenvolver uma aventura que é bem contida em si, e apresenta uma porção de elementos repletos de “legalzice” que tornam os episódios uma delícia de acompanhar. Em vez de jogar para fora, com outros universos gigantescos se enfrentando, o roteiro joga pra dentro, com os personagens indo prum local limitado, novo, e extremamente interessante de explorar.
O jeito como as viagens são feitas para dentro e fora, ou entre os mundos do próprio mundo dos demônios, é hilário. São peixes gigantes em pontos específicos, tão mal humorados quanto quaisquer salary men de escritórios japoneses, que já não têm mais paciência alguma para quem não segue as regras.
É legal também como justificam alguns pontos dentro do próprio universo de Dragon Ball a partir daqui. Como o fato de os moradores do mundo dos demônios terem as orelhas pontudas. De modo que, as raças dos personagens já conhecidos que têm as orelhas pontudas, como Piccolo e os demais namekuseijins, Shin, Kibito, e Sr. Popo, serem de diásporas que ocorreram para fora de lá em algum momento, por algum motivo. Ansioso para eventualmente encontrarem a raça do Pilaf, um dos meus personagens favoritos, e explicarem o porquê dele estar na Terra.
Também é bacana a expansão toda que dão relacionada à presença do Majin Boo, que parte da culpa de tudo ali ser tão ruim é do uso do Mago Bibidi com ele.
Para além disso, também há espaço para que Daima faça o que Dragon Ball já fazia há muito tempo: criticar governos ditatoriais. Vê-se aí muito do dedo do Akira Toriyama, que trabalhou no desenvolvimento dessa série. O mundo dos demônios é dividido em três partes, com castas sendo colocadas como superiores e inferiores. Os moradores do terceiro mundo, inclusive a família real, usam coleiras que sugam seus anos de vida como pedágio para o Rei Gomah.
A polícia militar aqui é colocada como violenta, abusiva, ditatorial, cruel. E mesmo Dabura, que era visto como “moderado” em comparação com o Gomah, também carrega aquele ar “endeusado” (estranho usar essa palavra para descrever um rei demônio) que figuras ditatoriais/monarquistas carregam. Em dado segmento, os personagens sobrevoam uma estátua gigantesca e opulenta dele em meio à pobreza do terceiro mundo. Um contraste bacana aos olhos.
Enfim, por essa primeira leva de episódios, Daima já parece bem mais promissor que seu antecessor. É um animê extremamente simpático, em que os personagem exalam carisma, com cenas de ação muito bacanas, vilões criativos, um universo novo e cheio de novos elementos para serem explorados, e toda aquela sensação de “desenho para assistir no café da manhã do fim de semana” que os melhores animês da Toei conseguem nos propiciar.
Dragon Ball Daima é um animê original da Toei Animation, com conceitos criados pelo próprio Akira Toriyama (criador da série), dirigido por Yoshitaka Yashima e Aya Komaki, roteiro de Yuuko Kakihara e, novamente, Akira Toriyama. Está em exibição aqui no Brasil por diferentes plataformas: Crunchyroll, Netflix, Max e Claro Video.
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