2024 não foi exatamente um ano excelente para a indústria cinematográfica. A indústria em geral ainda não se recuperou totalmente do baque do COVID-19 e da invasão dos streamings, e provavelmente nunca alcançará novamente os patamares de 2019.
Entretanto, o número de salas abertas voltou ao patamar pré-pandemia, e o público está voltando às salas aos poucos, com 125 milhões de espectadores — um valor abaixo dos 173 milhões de 2019, mas um crescimento de 9,6% em relação a 2023.
Por outro lado, ao menos no Brasil, a indústria de filmes de animê teve um ano fantástico. Foi de longe o ano com mais lançamentos que o Brasil já teve, com 11 títulos lançados em circuito comercial, contra os 7 títulos do segundo lugar, 2022.
Em questão de público, é o terceiro maior ano da história, perdendo apenas para 2000 (quando os dois primeiros filmes de Pokémon foram aos cinemas) e para 2019 (quando Dragon Ball Super: Broly foi lançado).
Dos onze lançamentos, dois deles se destacaram, curiosamente lançados na mesma data: O Menino e a Garça, mais novo filme do estúdio Ghibli e distribuído no Brasil pela Sato Company, levou 441 mil espectadores ao cinema. Em segundo lugar, mas não muito longe, o filme Demon Slayer: Kimetsu no Yaiba – To The Hashira Training atraiu 387 mil espectadores.
Em terceiro lugar, mas não menos impressionante, temos HAIKYU!! THE DUMPSTER BATTLE, que apesar do público total ser menos da metade de Kimetsu, teve a maior ocupação média de sessão da lista inteira, com 30,3 espectadores por sessão.
Embora sejam números encorajadores, eles continuam muito aquém do potencial do mercado na região. Com 1,15 milhão de espectadores em 2024, o mercado cinematográfico de animê no Brasil não chega a 1% da bilheteria total — em comparação, animê representa em torno de 6% do mercado de streaming mundial, segundo a Associação de Animações Japonesas (via ANN), e o Brasil historicamente tem um consumo acima da média do gênero, refletindo em sua importância para a Crunchyroll, por exemplo, sendo é a segunda maior fatia de mercado do streaming (atrás apenas dos EUA).
Além disso, os filmes que chegam ao Brasil são uma pequena parcela da variedade que esteve disponível para o público japonês no ano passado. O site LiveChart.me registra 53 títulos lançados nos cinemas japoneses em 2024, e mesmo após retirar compilações, musicais e infantis, ainda restam 35 lançamentos para o público geral que não deram as caras nos nossos cinemas.
Cinco deles receberam lançamento diretamente em streaming — Netflix lançou Minha Querida Oni e o filme de Mononoke, enquanto a Crunchyroll disponibilizou given: Hiiragi Mix e a dupla KURAYUKABA & KURAMERUKAGARI.
Mesmo assim, vários títulos grandes não deram as caras por aqui. Entre eles estão blockbusters como Detective Conan & The Million-dollar Pentagram, o filme mais assistido do Japão em 2024 com mais de 10 milhões de ingressos vendidos, e Mobile Suit Gundam SEED Freedom, o sexto filme mais assistido com mais de 3 milhões de ingressos vendidos (e cujas roupas licenciadas curiosamente vieram para cá).
Além desses, também não vieram obras de estúdios e diretores famosos, como Trapezium e FURERU (ambos do estúdio CloverWorks), e The Colors Within (dirigido por Naoki Yamada no estúdio Science SARU). Trapezium chegou a receber um evento especial de lançamento nos EUA, exibido em um único dia, organizado pela Crunchyroll.
Por falar em Crunchyroll, é válido apontar o papel que a empresa vem desempenhando para o crescimento da indústria, lançando sete dos onze filmes de anime deste ano — todos os sete sendo continuações/compilações de séries de TV bem-estabelecidas e já disponíveis em seu catálogo, servindo tanto como fonte de receita quanto como investimento em divulgação e promoção da franquia de um modo mais amplo, conforme o modelo de media mix.
Os outros quatro foram, cada um deles, lançados por distribuidoras distintas, como Sato Company (O Menino e a Garça), Warner (O Senhor dos Anéis: A Guerra dos Rohirrim), Cinecolor (LOOK BACK) e Trafalgar (Interstella 5555). Ausente desta lista está a Paris Filmes, que trouxe Belle em 2022 e Digimon Adventure 02: The Beginning em 2023, mas não atuou no ramo em 2024.
Os prospectos para 2025 também são bastante animadores. Entre os grandes destaques, temos o antecipadíssimo filme de Chainsaw Man, que continua a história da série de TV e que ressurgiu recentemente com um trailer que surpreendeu a muitos; Demon Slayer: Infinity Castle, adaptando o penúltimo arco do mangá e se aproximando perigosamente do final; e Scarlet, o novo filme do diretor Mamoru Hosoda (de Belle e O Menino e o Monstro).
Outros títulos interessantes incluem um novo filme de Miss Kobayashi’s Dragon Maid, a popular romcom de Coolkyousinnjya animada pela Kyoto Animation; Batman Ninja vs. Yakuza League, uma obra da Polygon Pictures cuja primeira parte recebeu ótimas críticas, mas que muito provavelmente vai dar as caras diretamente no Max, Madoka Magica: Walpurgisnatch Rising, continuação da popular série de garotas mágicas, e Mobile Suit Gundam GQuuuuuuX (lê-se “gikyuu-écks”), que estreia agora em janeiro e chamou a atenção tanto por seu elenco estelar (incluindo o lendário Hideaki Anno) quanto por seu nome incomum.
Além dos lançamentos, tivemos também alguns anúncios relevantes para o mercado durante a CCXP. A Crunchyroll anunciou ter adquirido os direitos do filme-compilação Attack on Titan: THE LAST ATTACK, que tem forte potencial de um lançamento comercial em 2025, enquanto a Sato Company anunciou ter adquirido Detective Conan & The Million-dollar Pentagram, além de ter planos para explorar seu catálogo de 22 filmes do Studio Ghibli nos cinemas
Por outro lado, certos movimentos do mercado global podem representar entraves para nós, brasileiros. A aquisição da GKIDS pela Toho é um claro sinal de que a distribuidora está interessada em atuar in loco no mercado americano e, observado no contexto de recentes rumores, uma indicação de que ela queira gerenciar pessoalmente suas licenças na região, ao invés aos cuidados da Crunchyroll. Claro que eles podem, em último caso, continuar a distribuir seus filmes via Sony/Crunchyroll na América Latina (uma manobra óbvia, visto que é o maior distribuidor da região), mas as águas estão um pouco mais turvas do que estavam um ano atrás.
Adicionalmente, é difícil estimar qual o impacto das novas cotas de tela da ANCINE na disponibilidade de salas e sessões para filmes estrangeiros de menor apelo. A nova regra não vai afetar um Demon Slayer ou um HAIKYU!!, mas, por mais benéfica e necessária que seja, tem o potencial de prejudicar lançamentos minúsculos como LOOK BACK e Interstella 5555.
Siga e acompanhe as notícias do JBox também pelo Google News e em nosso grupo no Telegram.