Em 2021, durante a pausa de Chainsaw Man após o fim da primeira parte, Tatsuki Fujimoto começou a lançar uma série de one-shots que deixaram o público em polvorosa por alguns meses. O autor estava voltando ao tipo de produção que fazia em suas origens, o que acabou trazendo um teor mais pessoal para as obras, com destaque principal para uma delas, que claramente contava um reflexo da vida do próprio autor. E foi justamente ela, com sua sensibilidade distinta, que conquistou mais o carinho do público e da crítica, levando a uma inesperada adaptação para filme animado. Sim, estamos falando de Look Back.

O filme é a primeira grande produção do Studio Durian, sendo um projeto coordenado por Kiyotaka Oshiyama, que ficou responsável por praticamente todas as funções principais do filme, incluindo direção, tanto geral quanto de animação, e roteiros. Na história, acompanhamos Fujino, uma garota que faz mangás 4-koma (“tirinhas” de quatro quadros) para o jornal da escola e constantemente se gaba por isso. No entanto, depois que Kyomoto, uma garota que não sai de casa, também começa a lançar tirinhas para o jornal, Fujino percebe a diferença de talento para o desenho entre elas e começa a entrar em uma jornada para melhorar como artista, o que eventualmente a faz se aproximar de sua suposta rival.

A partir da aproximação de Fujino e Kyomoto, o filme começa a abordar a relação entre as duas jovens desenhistas. Inicialmente, acompanhamos principalmente o ponto de vista de Fujino, que acaba descobrindo que sua colega tem mais em comum com ela do que imagina.

Apesar de ser um filme também com foco na criação de mangás, a narrativa tem foco principal em mostrar como a relação da dupla se desenvolve, não só como mangakás, mas também como amigas adolescentes tentando aproveitar um pouco da vida. Isso acaba sendo importante principalmente no caso de Kyomoto, que por viver trancafiada por medo de sair de casa, não conseguia aproveitar sua juventude, porém se reencontrou com a vida justamente após conhecer sua amiga. E mesmo Fujino também começa a criar uma nova perspectiva a partir daí, já que ela passou alguns anos muito focada em melhorar sua arte, deixando o resto da sua vida de lado. Porém, ao conhecer Kyomoto, ela não só consegue conciliar as duas coisas como até mesmo vê uma melhoria em seu progresso pessoal como artista trabalhando ao lado da amiga.

imagem: Kyomoto e Fujino lendo juntas uma revista de mangás durante uma cena de Look Back.

Reprodução: Studio Durian.

Contudo, nem tudo são flores. Com a vida adulta e novas descobertas chegando, o caminho de Fujino e Kyomoto começa a se dividir, criando uma ruptura na relação das duas, já que elas desejam seguir caminhos diferentes na arte, com uma querendo continuar no mundo dos mangás e outra querendo seguir carreira artística mais tradicional, entrando em uma faculdade de artes. Todo esse processo é retratado de maneira bem dolorosa no filme, algo que se estende para o terceiro terço da história.

O longa, em sua completude, consegue repassar muito bem o progresso pessoal das duas personagens. É interessante perceber o paralelo entre as estações passando quando Fujino estava desenhando sozinha e solitária com quando ela está fazendo a mesma coisa, mas ao lado de Kyomoto. Os passeios da dupla geravam conteúdo para inspirar a produção de mangás, em cenas sempre lotadas de sorrisos que contrastam bem com os anos de frustração de Fujino e os de isolamento de Kyomoto.

A delicadeza do roteiro também aparece nas expressões das personagens, que, antes obscurecidas pelos problemas, começam a clarear e tornar uma forma mais amigável e cada vez mais colorida, algo que se impulsiona ainda mais pela produção um tanto artesanal do filme. Tudo isso dá mais expressividade para as cenas, tanto as mais calmas quanto as com mais ação, como o momento em que Fujino corre alegremente na chuva após descobrir que Kyomoto sempre admirou seu trabalho ao som de uma trilha emocionante. A trilha sonora, inclusive, também é excelente, contribuindo bastante para o aspecto emocional da obra.

imagem: Kyomoto tendo sua mão puxada por Fujino durante um passeio na rua. Kyomoto está sorridente durante a cena.

Reprodução: Studio Durian.

Da mesma forma, quando os problemas começam a surgir, a expressividade também surge na sobriedade dos momentos de frustração retornando de forma ainda mais drástica. É algo que fica ainda mais óbvio quando questões inevitáveis da vida adulta começam a surgir, não só no trabalho, mas também na vida pessoal de Fujino. A situação deixa bem claro que se distanciar de quem por muitos anos foi sua luz afetou a protagonista, mesmo que ela tenha uma carreira estável que seria o sonho de qualquer um.

O capricho do filme também surge em momentos que ele nos mergulha no mundo dos mangás desenhados pela dupla, entregando animações completas “adaptando” as tirinhas 4-koma. Desde algo que poderia ter saído de Crayon Shin-chan até pinceladas mais tradicionais, mostrando a calmaria dos corredores de uma escola, contraste de estilos que mostra as diferenças entre as protagonistas e como a relação delas com a arte afeta toda a história.

O que mais surpreende em isso tudo é que Look Back, mesmo com suas adições e caprichos em relação ao mangá, é um filme conciso e bem curto, não deixando se distanciar demais da obra original, mas ainda tendo um charme que o torna em uma produção com vida própria. Muito se deve ao trabalho com a animação, que consegue ser bastante singular mesmo entre outras produções cinematográficas de animê. Esse carinho faz bastante jus ao tipo de história que a produção retrata, mostrando que a paixão pela arte é algo essencial para o ser humano desde a infância e que pode marcar por toda uma vida e até mesmo se estender para outras vidas.

imagem: Fujino em um quarto escuro em cena de Look Back. Em uma janela ao fundo, várias tirinhas de mangá estão coladas.

Reprodução: Studio Durian.

Look Back é um filme fundamental para fãs de animês e mangás como um todo, sendo uma das mais belas reflexões não só sobre esse meio artístico, mas principalmente sobre quem está por trás da produção dessas obras. É um apontamento direto que quem está por trás da arte são humanos que carregam seus próprios sentimentos, como as produções são carregadas dessas emoções e como isso é refletido em nossas relações pessoais.

Look Back estreia no próximo dia 26 de setembro nos cinemas brasileiros. O JBox foi convidado para uma exibição especial do filme que serviu de base para a produção da resenha.


O texto presente é de responsabilidade de seu autor e não reflete necessariamente a opinião do site.


Siga e acompanhe as notícias do JBox também pelo Google News e em nosso grupo no Telegram.


O Rio Grande do Sul segue em situação de calamidade pública, passando por uma das piores tragédias da história do estado, após fortes chuvas e enchentes que permanecem em algumas regiões. O governo estadual reativou o PIX do “SOS Rio Grande do Sul”, criado ano passado, quando o estado foi também assolado por fortes chuvas, para receber doações que serão direcionadas para dar apoio humanitário às vítimas. Para ajudar, doe pela chave CNPJ 92.958.800/0001-38.

Alternativamente, há outras opções de doação, que também trabalham com ajuda premente, como a Vakinha (Movimento SOS Enchentes) e as Cozinhas Solidárias, do MTST (oferece comida para desabrigados e necessitados). Os Correios estão recebendo doações de insumos (roupas, itens básicos, alimentos etc) para envio sem custo às vítimas. Se preferir, doe para outra instituição de sua confiança.