Entrevista publicada originalmente em 7 de março de 2020.
Um cenário impensável se materializou na última quarta-feira (4). Um animê icônico dos anos 1970, mas completamente desconhecido do grande público no Brasil, estreou pela maior plataforma de streaming do mundo – com direito a uma inédita dublagem em português.
Mazinger Z foi o precursor dos robôs gigantes pilotados por um ser humano numa espécie de “simbiose”. Talvez Gundam e Evangelion nunca tivessem existido se a obra do renomado Go Nagai não tivesse nascido em 1972 e ganhado sua versão animada pela Toei Animation no mesmo ano. Os 92 episódios da série marcaram a geração japonesa de sua época e foram um grande sucesso fora também, quando exibido em países como Espanha, México e Peru. Mas nunca no Brasil.
Apesar desse atraso de décadas, a Toei resolveu dublar a série, um trabalho que aconteceu há 4 anos no estúdio BKS, de São Paulo, mas só em 2020 ganhou seu espaço em uma estreia na Netflix (sem muito alarde). Antes disso, em 2018, o filme Mazinger Z: Infinity, produção recente do robozão, encarou cinemas no Brasil em sessões especiais pela rede Cinemark apenas com cópias legendadas. O filme chegou posteriormente a plataformas digitais de compra e aluguel, trazendo uma dublagem feita pelo estúdio Unidub – que manteve o elenco da BKS, até então desconhecido do público.
Koji, o personagem principal de Mazinger Z, não é o primeiro protagonista em animês de Lucas Gama, dublador de destaque na cena atual de São Paulo. Ele já foi o Cyborg 009, outro clássico personagem japonês, na série ‘Call of Justice‘ (disponível também na Netflix).
O JBox conversou um pouco sobre a dublagem de Mazinger com o Lucas, no papo que você confere a seguir.
Como e quando você entrou para a dublagem? Algum animê na infância influenciou a sua decisão de entrar nessa carreira?
Lucas: Eu comecei há 9 anos. Dividia meus horários de dublagem trabalhando como caixa numa farmácia aqui em São Paulo. Mas meu trabalho em dublagem foi crescendo, ganhando destaque até que na minha vida profissional só tinha espaço pro meu sonho, que é a dublagem. Hoje sou realizado! Com certeza, parte da minha vocação para dublagem se dá à influência de animês que amo muito, como Pokémon, Inuyasha, Digimon, Dragonball, Sailor Moon, Yu Yu Hakusho, mas principalmente minha Sakura Card Captors (fada sem defeitos). ♥
Mazinger Z é uma série dos anos 1970, que foi um grande sucesso em vários países décadas atrás, mas só agora chegou ao Brasil. Quando te apresentaram esse trabalho você tinha alguma noção do que se tratava?
Lucas: Eu não sabia de absolutamente nada, mas quando ganhei o papel, pesquisei e estudei bastante pra entender melhor o personagem e seu universo.
Você fez alguns papéis em animês recentes, como Mob Psycho 100. Quais as grandes diferenças em dublar uma produção japonesa atual e um material tão antigo?
Lucas: Nos animês atuais, nós podemos dar voz aos personagens com mais naturalidade e liberdade, pois o estilo de animação, roteiro e voz original geralmente é mais fluído e ritmado. Já nos animês antigos, temos menos animação, mais diálogos e esses diálogos não refletem a nossa forma de falar atual. Por isso, no meu trabalho em Mazinger Z, procurei homenagear a dublagem clássica que ouvi nos animês antigos pra que essa dublagem casasse cem por cento com a imagem que está na tela.
E do Koji do filme “Infinity” para o Koji da série. Muda algo na interpretação?
Lucas: No Koji o personagem foi atualizado para tempos mais modernos, o que exigiu uma outra pegada na hora de interpretar o personagem. Eu pessoalmente adorei interpretá-lo com essa atualização.
A série tem passagens que hoje em dia talvez sejam vistas como “pesadas demais” para crianças. Recorda de algum momento que tenha te impressionado de alguma forma quando dublou?
Lucas: Sim, fiquei chocado em vários momentos, exemplo: Quando ele bateu na Sayaka, quando ele foi pro hospital com a cabeça rachada, quando ele bate no Shiro, quando um personagem, que não vou dizer quem é pra não dar spoiler, morreu brutalmente atingido por uma viga de metal.🤣
Existia alguma “imposição” na hora de dublar o personagem ou você moldou a atuação livremente?
Lucas: Pelo contrário, a diretora me deixou livre pra criar e fazer o Koji do meu jeito, mantendo as características originais do personagem, claro. [Nota: Laudi Regina foi a diretora da dublagem]
Saindo um pouco de Mazinger, pode nos contar alguns trabalhos que você já fez e que te marcaram na carreira da dublagem?
Lucas: Bom, em animês, eu já fiz o Dondokomon em Digimon Fusion, Shu em Diabolik Lovers, Reita em Saiko Kusuo no Psi-nan, Cyborg 009– fazendo o próprio, filmes do Studio Ghibli como NinoKuni, onde fui o Gnaus [Nota: este filme foi produzido pelo estúdio OLM, mas é baseado em um game com animações do Ghibli] e Spiller em O Mundo dos Pequeninos. Saindo um pouco do mundo dos animês eu sou a voz do Timothée Chalamet aqui no Brasil, um ator que sempre me desafia e que adoro dublar.
Há algum tipo de personagem que ainda não fez e gostaria de fazer?
Lucas: Olha, eu gostaria de ser um príncipe da Disney, seria meu sonho! Que dublador nunca sonhou com isso, não é mesmo?! Quem sabe no futuro…
Pode deixar um último recado aos fãs de dublagem e de animês que vão maratonar Mazinger Z pela primeira vez?
Lucas: A série não reflete nosso ponto de vista social atual, mas pra você que curte animês como Gundam, Macross e Evangelion… Mazinger Z é uma forma de viajar na história e buscar as primeiras inspirações dos criadores de obras como essas. É uma animação repleta de cenas de ação e designs de tirar o fôlego. Ah! A dublagem também tá ótima, hein gente?! Hahahahah! Um beijo, meu povo!